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Volta de Lula ao cenário eleitoral dá novo impulso a discurso de Bolsonaro contra a esquerda e o PT

Postado às 07h11 | 10 Mar 2021

Globo

A possibilidade de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se candidatar em 202 deu novo impulso ao discurso do presidente Jair Bolsonaro de que está numa cruzada contra o PT, a esquerda e a corrupção. A narrativa que elegeu Bolsonaro em 2018 vinha perdendo a força diante do desgaste do mandato e pela crise da pandemia da Covid-19, mas, na avaliação de interlocutores do governo, é novamente impulsionada pela reviravolta causada pela decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que anulou as condenações de Lula na Lava-Jato, o que o tornou elegível novamente.

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Apesar de ter criticado a decisão monocrática de Fachin, Bolsonaro viu na decisão a chance também de sair do foco das críticas e voltar ao ataque. Aliados do clã Bolsonaro avaliam que a elegibilidade de Lula dá uma cara ao “inimigo” e reforça o discurso de que o “ameaça comunista” está viva, o que entusiasma a militância numa luta de “bem contra o mal” nas redes sociais, onde o bolsonarismo vinha perdendo espaço. Integrantes do governo também acreditam que Bolsonaro saberá tirar proveito da situação.

Nesta terça-feira, a estratégia de reforçar o discurso contra o PT já começou a ser colocada em prática. Sem mencionar a decisão de Fachin ou Lula, Bolsonaro publicou nas redes sociais: “Ninguém vence uma maratona se não estiver preparado. Aos que teimam em desunir, lembre-se que existe algo a perder mais que a própria vida: a liberdade”. As frases foram acompanhadas de um vídeo antigo, gravado em dezembro de 2019, em Palmas (TO), em que o presidente inicia o discurso dizendo que não “é fácil assumir o Brasil com uma crise ética, moral e econômica”.

Em quase quatro minutos, Bolsonaro reforça seus motes na campanha, como a defesa da família, diz que é “temente a Deus” e defende o combate à corrupção. “Viajei o mundo durante a minha pré-campanha. A vergonha de ser recebido lá fora com o manto da desconfiança. Um país do carnaval, do sexo e da corrupção. Isso está mudando. Pode ser que haja corrupção no meu governo. Sim, pode ser que haja. Pode ser que haja aqui e o governador não saiba, o prefeito não saiba. Pode. Mas, onze anos de governo, zero de corrupção. Se aparecer, boto no pau de arara o ministro”, disse. 

A publicação foi replicada pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), investigado por desvios de salários de funcionários no período em que foi deputado estadual no Rio. No mês passado, Flávio foi beneficiado por uma decisão o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que anulou as quebras de sigilo bancário e fiscal no caso das “rachadinhas”. No início deste mês, o site “O Antagonista” revelou que o filho mais velho do presidente comprou uma mansão no valor de R$ 5,7 milhões no Lago Sul, área nobre de Brasília.

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O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) também usou o Twitter para comentar a decisão de Fachin. “Não há como ‘desver’ os escândalos de corrupção durante os tempos de Lula na Presidência. Limpar sua ficha só aumentará o sentimento de insatisfação da população”, escreveu o parlamentar, que integra a delegação brasileira que está em Israel para, segundo o governo, “buscar acordo na área de tecnologia e ciência”. Na mesma postagem, Eduardo defendeu o voto impresso, outra bandeira que entusiasma a militância. “E pouco importa se em 2022 haverá Lula ou não, o foco da democracia tem que estar no voto impresso e auditável.”

Para um integrante do governo, a elegibilidade de Lula é, para o bolsonarismo, a volta da figura do “vilão” ao jogo político e gera o “sentimento de injustiça na população”. Para um interlocutor do Planalto que acompanha as tratativas sobre reeleição em 2022, Bolsonaro se beneficia porque Lula também “divide a esquerda e oxigena a narrativa da direita.”

— (A elegibilidade do Lula) favorece, sim, o discurso antipetista. Na realidade, esse discurso enfraqueceu porque considerávamos o PT morto. Agora vai reacender — disse o líder da Frente Parlamentar da Segurança Pública, Capitão Augusto (PL-SP). 

Compra de vacinas

Em outro movimento para aplacar o desgaste que se acentua à medida que aumenta o número de mortes por coronavírus, Bolsonaro aposta na compra de vacinas e no fluxo da aplicação dos imunizantes para se blindar das críticas de sua condução ao enfrentamento à pandemia.

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Com a crise sanitária no Brasil em seu momento mais crítico e diante da pressão de governadores, Bolsonaro vai usar como argumento que, apesar das próprias declarações e atrasos na compra dos imunizantes, não se omitiu.

Na segunda-feira, Bolsonaro se reuniu, por teleconferência, com executivos da Pfizer, após ter se recusado a comprar os imunizantes da farmacêutica no ano passado. O presidente anunciou 14 milhões de dose da vacina até junho.
 
— Reconhecemos a Pfizer como uma grande empresa mundial, com grande espaço no Brasil também. Em havendo possibilidades, nós gostaríamos de fechar contrato com os senhores, até pela agressividade com que o vírus tem se apresentado no Brasil — disse.  

Bolsonaro, contudo, não deve voltar atrás em seu discurso que condena o distanciamento social e medidas de lockdown adotadas por governadores. O presidente deve reforçar que o esforço para a vacinação vai permitir que a economia siga funcionando.

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