Postado às 04h48 | 10 Mar 2020
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, assinou no domingo (8), na cidade de Doral, no estado americano da Flórida, um acordo de cooperação com os EUA nas áreas de “pesquisa, desenvolvimento, testes e avaliações” de material de defesa e de segurança.
Para entrar em vigor, o acordo ainda precisa ser aprovado pelo Congresso brasileiro. Essa dependência da ratificação no Legislativo ocorre num dos maiores momento de tensão entre os dois Poderes desde que Bolsonaro tomou posse, em janeiro de 2019.
Os aspectos econômicos
“Estamos varrendo a esquerda para fora do Brasil e isso é muito bom”, disse Bolsonaro em discurso, ao lado de Trump, no resort. “O presidente do Brasil vem fazendo um trabalho fantástico”, disse o presidente americano, na sua vez.
Antes da assinatura deste acordo, o Brasil, sob Bolsonaro, já havia sido declarado um aliado americano extra-Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), além de ter recebido apoio da Casa Branca para iniciar o processo de inclusão entre os países-membro da OCDE, espécie de clube dos países ricos.
Os aspectos militares
No campo da Defesa, o acordo aumenta a aproximação existente entre os dois países desde a Segunda Guerra Mundial, em 1945 – fato mencionado pelo comandante americano Craig Faller na cerimônia de assinatura do texto.
Essa reaproximação aponta para uma sincronia cada vez maior entre as visões americana e brasileira a respeito de assuntos como a crise na Venezuela. A Venezuela foi mencionada nominalmente por Faller na assinatura do acordo, o que dá a entender que o assunto é prioridade na agenda dos EUA para a América Latina, e que o atual governo brasileiro, à medida que estreita seus laços militares com os americanos, torna-se cada vez mais parceiro dessas políticas.
O atual governo americano já falou abertamente na possibilidade de uma intervenção militar para tirar o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, do poder. Autoridades brasileiras vêm respondendo a isso com uma coleção de declarações que oscilam entre a negação dessa hipótese, o apoio aberto e algo entre uma coisa e outra, dependendo do momento – como quando Bolsonaro diz que a chance de intervenção não é de zero, mas “próxima de zero”.
De forma mais ampla, para além do aspecto regional, a assinatura do acordo teoricamente põe o Brasil como possível parceiro no desenvolvimento de tecnologias de ponta na área militar. O texto também facilita o acesso brasileiro a tecnologias tidas como sensíveis e facilita relações semelhantes com outras potências aliadas dos EUA, além de incluir as forças brasileiras e um número maior de exercícios e testes conjuntos.
Acordo é mais amplo do que parece
Gunther Rudzit, professor de Relações Internacionais na ESPM, que foi assessor do ministro da Defesa Geraldo Magela Quintão, em 2001 e 2002, durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, disse ao Nexo que o acordo vai muito além da produção de material bélico.
“O acordo abre oportunidades de negócios também para empresas do setor de segurança, não apenas de defesa. Ele engloba a produção de revólveres, de pistolas, de coletes à prova de bala, de kits médicos, de kits alimentares, toda essa gama de material que atende à àrea de defesa”, disse Rudzit.
“Há várias empresas brasileiras bem estabelecidas que, com acesso a esse mercado americano e consequentemente a esse mercado dos aliados americanos na Otan, poderão participar de concorrências. Não é certo que eles entrarão nesse mercado, mas só de terem a oportunidade de participar dessas concorrências já coloca para elas uma perspectiva muito boa”, afirmou o pesquisador.
Além disso, Rudzit também crê que o acordo dará acesso para as Forças brasileiras a programas que permitam a modernização do setor de Defesa.
João Paulo Charleaux é repórter especial do Nexo e escreve de Paris