Postado às 08h06 | 06 Set 2020
Folha
Destinatário de R$ 199 milhões do fundo eleitoral, ou seja, quase 10% do total, o PSL adotou uma posição inusual na definição dos critérios de divisão do bolo entre os seus candidatos a prefeito e vereador.
Primeiro, atendendo a uma exigência da lei, entregou ata de decisão de sua executiva ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) informando que 50% da bolada, ou seja, cerca de R$ 100 milhões, seriam distribuídos a critério exclusivo da executiva nacional da legenda, comandada pelo deputado federal Luciano Bivar (PE).
Bivar é um dos políticos no centro das suspeitas da promoção de candidaturas laranjas em 2018.
De posse dessa documentação, o TSE aprovou o repasse das verbas ao partido, já que a lei exige apenas isso, a informação dos critérios à Justiça e a sua ampla divulgação.
Procurado nesta sexta-feira (4) pela Folha, porém, o ex-partido do presidente Jair Bolsonaro informou que adotou modelo diferente daquele informado às autoridades.
Segundo o partido, por orientação de compliance da empresa de consultoria Alvarez & Marsal, decidiu transferir a decisão do rateio para uma comissão formada dentro do partido, chefiada pelo deputado federal Delegado Waldir (GO).
Bivar integra essa comissão, mas o PSL afirmou que ele se licenciou por ser do grupo de risco da Covid-19. A comissão estabeleceu repasses para os estados, tomando como base a votação de 2018. São Paulo (R$ 25 milhões), Minas (R$ 15 milhões) e Goiás (R$ 14 milhões) foram os mais contemplados.
Comum no ambiente corporativo, o compliance (conformidade) é um conjunto de normas e procedimentos para prevenir, detectar e punir irregularidades cometidas por funcionários —ou por filiados, no caso dos partidos.
Eventuais discrepâncias entre os critérios informados ao TSE e aqueles efetivamente aplicados pelos partidos podem representar problemas às siglas na análise de suas prestações de contas pela Justiça Eleitoral.
O PSL diz que agirá com transparência, prestando todas as informações às autoridades. O partido afirma que o trabalho da empresa de compliance já resultou em algumas medidas, entre elas a transferência da decisão sobre os critérios para a comissão interna, com o objetivo de tirar o caráter de centralização do manuseio do dinheiro.
A análise dos critérios estabelecidos pelos partidos para divisão do fundo eleitoral entre seus candidatos (21 das 33 siglas já entregaram suas decisões ao TSE) mostra que vários mantêm a tendência de estabelecer normas vagas e de concentrar nas mãos dos caciques partidários e dos congressistas as principais definições.
O PSDB, por exemplo, entregou à Justiça Eleitoral uma ata enxuta, que coloca a divisão dos recursos, basicamente, nas mãos dos dirigentes e congressistas.
"A resolução do PSDB, aprovada pelo TSE, definindo os critérios para o fundo representa uma orientação geral de um processo complexo que se inicia. Reflete discussões democráticas ocorridas dentro do partido. A política é uma ciência humana e como tal, critérios objetivos nunca serão perfeitos”, disse o presidente do partido, Bruno Araújo, por meio de sua assessoria.
Entre os partidos que apresentaram de forma bem mais detalhada os critérios de repasses das verbas aos seus candidatos estão MDB, PV e PSD.
Até agora, o Novo e o PRTB, do vice-presidente Hamilton Mourão, recusaram o recebimento dos recursos públicos.
O fundo eleitoral é a principal fonte de financiamento das siglas. Foi criado em 2017 pelo Congresso após a proibição, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), de que empresas façam doações às campanhas políticas. Neste ano, distribuirá R$ 2,035 bilhões aos partidos.