Postado às 03h48 | 28 Jun 2020
Estado
A história é pródiga em exemplos de personagens menores que assumiram posições de comando em dadas circunstâncias e tornaram-se grandes ao mostrarem estar à altura da responsabilidade que passou a lhes pesar sobre os ombros. Jair Bolsonaro não corre esse risco. A ele a história reserva um lugar nada honroso por sua péssima condução do País durante a maior emergência sanitária deste século. O Brasil chora a morte de mais de 55 mil pessoas por covid-19 – sem contar a enorme subnotificação de casos – e não são poucas as autoridades sanitárias brasileiras e estrangeiras que alertam para o fato de que o País ainda não atingiu o pico de infecções pelo novo coronavírus. Ou seja, há semanas muito infelizes por vir antes que a pandemia mostre sinais de arrefecimento.
É triste constatar que poderia não ter sido assim. Como maior liderança nacional, o presidente Jair Bolsonaro deveria ter unido as forças vivas da Nação em torno de um plano conjunto de enfrentamento da pandemia, coordenando, no âmbito da União, as ações dos Estados e municípios. A propósito, o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão que Bolsonaro faz questão de distorcer para se eximir de sua responsabilidade pessoal e intransferível, decidiu exatamente nesse sentido, destacando a competência concorrente dos entes federativos prevista na Constituição.
Em artigo publicado no Estado, o senador José Serra (PSDB-SP) destacou a “epidemia de desgoverno” que assola a educação pública no País, absolutamente abandonada à própria sorte pelo presidente e por seus indicados para o Ministério da Educação. Não seria exagero estender a expressão cunhada pelo senador paulista à área de saúde, também jogada ao relento por incompetência, descaso e mero cálculo eleitoreiro. A ignomínia jamais será esquecida por milhões de brasileiros responsáveis, solidários e compassivos.
O desgoverno de Jair Bolsonaro mereceu reprimenda do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU). Ao avaliar a ação do Centro de Governo montado para coordenar as ações de enfrentamento da pandemia no País, o ministro Vital do Rêgo criticou a falta do que chamou de “tom do topo”, ou seja, de uma voz de comando que, de fato, organize as ações nacionais. Ora, esta voz haveria de ser a do presidente da República, assessorado pelo Centro de Coordenação de Operações do Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19, sob responsabilidade do ministro-chefe da Casa Civil, Braga Netto. “Ainda que caiba a prefeitos e governadores estabelecerem parte das medidas para o enfrentamento ao coronavírus nos respectivos entes federados”, disse o presidente do TCU, “cabe ao Centro de Governo o papel de propor diretrizes estratégicas e os objetivos a serem atingidos, bem como articular e coordenar sua implantação com os demais órgãos e entidades da administração pública nos três níveis.” Custa crer que o presidente Bolsonaro precise ser lembrado pelo TCU de uma responsabilidade tão inerente a seu elevado cargo na República.
Fora do País, a visão sobre a atuação do presidente Jair Bolsonaro no curso da emergência sanitária não é menos negativa. Em duro pronunciamento na quarta-feira passada, talvez sua manifestação mais incisiva até o momento, o diretor de emergências da Organização Mundial da Saúde (OMS), Michael Ryan, disse que “o vírus não age sozinho, o vírus explora uma vigilância fraca, a má governança, a falta de educação”. Ryan se referia ao Brasil, respondendo a uma pergunta formulada por uma jornalista da Rede Globo sobre o grave estágio da pandemia no País. “Não há respostas mágicas, não existem feitiços (contra o coronavírus)”, conclui o diretor da OMS.
O Brasil não deveria ter de contar com “feitiços”, com a sorte ou com soluções milagreiras para passar por esta gravíssima crise sanitária da forma menos danosa possível. Aqui há centros de pesquisa de excelência, profissionais dedicados e reconhecidos internacionalmente. Há governadores e prefeitos imbuídos de espírito público. E há o Sistema Único de Saúde (SUS), valioso ativo da Nação. Tudo à disposição do presidente Jair Bolsonaro para auxiliá-lo na boa condução do País em meio aos perigos da tempestade.