Postado às 06h01 | 26 Dez 2023
Ney Lopes
O discurso natalino do presidente Lula neste Natal, em cadeia de rádio e TV, não se limitou a uma prestação de contas e exaltação à data magna da cristandade
Embora sem citar nomes, reavivou os episódios de 8 janeiro e insinuou penas severas contra adversários
Voltou a insistir na “tentativa de golpe” e as cicatrizes profundas que dividem o país.
O presidente mencionou os riscos para a democracia brasileira, diante das vidraças quebradas, invasões e depredação de prédios públicos e destruição de obras de arte e objetos históricos.
Salientou a importância do combate às "fake news" e aos discursos de ódio.
Percebe-se, que o objetivo de Lula neste Natal foi manter o país polarizado entre ele e o ex-presidente Bolsonaro.
Certamente será a estratégia para as eleições municipais de 2024, quando o presidente claramente deseja sair politicamente fortalecido.
Indaga-se por que essa estratégia, com ênfase político-eleitoral, se a nação espera o anúncio de soluções para as graves questões econômicas e sociais?
A resposta é simples.
Lula pensa em candidatar-se à reeleição, embora tenha declarado em 2022 nas redes sociais, que seria “presidente de um mandato só”.
Já na cadeira de chefe do Executivo, no entanto, ele reabriu a possibilidade de disputar a eleição novamente em 2026, “se (o país) estiver uma situação delicada” e sua saúde estiver “perfeita”.
O fato de admitir uma nova candidatura tem relação com o fato dele seguir estimulando confrontos de radicalização com os adversários para manter-se no poder.
De acordo com o IPEC, a reprovação ao governo aumentou cinco pontos entre setembro e dezembro e chegou a 30% mesmo com a reciclagem de programas de sucesso do passado e bons resultados econômicos do primeiro ano.
Muitos fatores contribuem para o atual choque político de direita e esquerda no Brasil.
O principal fator do atual acirramento político no país é o presidente Lula, seus correligionários e parte do STF, insistirem em considerar tentativa de golpe de estado o movimento político de 8 janeiro.
Em verdade, juridicamente não houve tentativa de golpe de estado, embora outros crimes possam ter sido praticados.
Pela lei brasileira, golpe de estado é tentar “Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”.
Em 8 de janeiro, não houve um “mentor”, que se apresentasse como “liderança” à frente dos rebeldes para assumir o governo, após sua queda.
Tudo gira em torno de suposições acusatórias ao ex-presidente Bolsonaro.
Fatos semelhantes ocorreram nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio, rigidamente apurada para identificação e punição dos envolvidos.
Em nenhum momento foi suscitada a hipótese de golpe de estado, embora o ex-presidente Trump tenha dado sinais de apoio aos rebeldes, o que não ocorreu no Brasil.
As condenações da Corte americana foram por outros crimes, que atentam contra a democracia.
Nunca, tentativa de golpe de estado.
Pode-se até admitir que para alguns empedernidos adversários do presidente Lula, o protesto político de 8 de janeiro tivesse o objetivo de um golpe de estado.
Todavia, ninguém é punido criminalmente por pensamento.
ULPIANO, jurista romano, prescrevia “cogitationis poenam nemo patitur” (ninguém pode ser punido exclusivamente pelos seus pensamentos).
O presidente Lula perdeu uma oportunidade de demonstrar a sua magnanimidade e lucidez política, ao não incluir nos casos do indulto natalino os participantes do movimento político de 8 de janeiro, desde que fosse devidamente demonstrada a inexistência de maiores riscos à sociedade e que a presença física do acusado limitou-se ao apoio em protesto político.
Muitos, dos que estão hoje nos cárceres, foram às ruas por motivações unicamente de protesto político.
Entretanto, o radicalismo não permite a individualização da culpa, princípio básico do direito penal.
O que se observa é o estímulo declarado à radicalização, a torcida pela condenação do maior número de participantes do 8 de janeiro, tudo com a única finalidade de colher benefícios político-eleitorais.
Note-se, que para agravar ainda mais esse clima de exacerbação política, o presidente Lula está anunciando manifestações públicas, no próximo dia 8 de janeiro de 2024, tudo a base da suposição, de que um golpe de estado foi tentado e fracassou.
Pelo que se vê, a partir dos propósitos manifestados pelo próprio presidente da República, não há razões para sonharmos em harmonia e paz política no país, a partir de 2024.
O “vale tudo” deverá ser, mais uma vez, a característica da eleição municipal próxima.
Infelizmente!