Postado às 06h27 | 31 Out 2021
Ney Lopes
O G20, que se encerra hoje em Roma, surpreendeu o mundo capitalista com uma decisão tomada neste sábado, 30.
Os líderes mundiais acordaram a criação de um imposto global de pelo menos 15% sobre as grandes multinacionais para garantir um sistema tributário mais justo.
O G20 é uma organização que reúne ministros da Economia e presidentes dos Banco Centrais de 19 países e da União Europeia.
Juntas, essas nações representam cerca de 80% de toda a economia global. O presidente Jair Bolsonaro esteve presente na reunião.
Abrangidas pela decisão do imposto global estão as grandes empresas com um volume de negócios global superior a 20 mil milhões de euros e uma rentabilidade superior a 10%, %, sendo a distribuição dos lucros feita entre os países onde cada empresa tem receitas superiores a um milhão de euros (ou 250.000 euros, nos Estados menores).
Os líderes chegaram a este acordo histórico, após quatro anos de intenso debate, sendo o objetivo evitar que as grandes empresas multinacionais se beneficiem de regimes fiscais complacentes, não pagando impostos nos países onde operam.
Tudo indica que a reunião do G20 avança, em razão da catástrofe da pandemia, que abre os olhos do capitalismo global.
A própria democracia e a economia de mercado estariam em risco, se tais medidas deixassem de ser adotadas.
O imposto global sempre foi defendido pela economista Mariana Mazzucato, professora de Economia da Inovação na University College London, na Inglaterra, onde é diretora-fundadora de um instituto de inovação na mesma universidade.
Ela também é autora do livro O Estado empreendedor: Desmascarando o mito do setor público vs. setor privado.
A economista inglesa defende uma mudança radical do capitalismo para o mundo pós-pandemia.
Um de seus objetivos é acabar com o mito de que o Estado é uma entidade burocrática, que simplesmente promove a lentidão.
Outro é demonstrar que na economia "o valor não é apenas o preço".
Para ela acontece uma "tripla crise do capitalismo".
Uma crise de saúde: a pandemia global confinou a maioria da população mundial, e está claro que somos tão vulneráveis quanto nossos vizinhos, local, nacional e internacionalmente.
Uma crise econômica: a desigualdade é uma causa e uma consequência da pandemia. A crise da covid-19 está expondo ainda mais falhas em nossas estruturas econômicas.
A terceira crise é climática, que exige medidas urgentes de consenso entre as nações.
A verdade é que cresce a tese de que para enfrentar os problemas dos “excluídos sociais” haverá de ser construído um crescimento inclusivo e sustentável, com investimento público impulsionado pelo conceito de bem comum e novos tipos de relações público-privadas.
Há necessidade de trazer grupos de cidadãos e sindicatos para a mesa de discussão, a fim de garantir que não apenas se tenha uma transição mais justa, mas que também haja vozes diferentes para definir que tipo de sociedade a humanidade deseja.
Sem dúvida, passa a época do “deus mercado”.
A lei da oferta e da procura continua fundamental e necessária para as relações econômicas e de negócios, porém ela cada dia assume mais compromissos com a sobrevivência das multidões famintas.
O investimento e a oferta de empregos não resolvem a questão da desigualdade social acentuada.
O emprego é um insumo como outro qualquer, que gera riqueza para os detentores do capital.
Nada contra essa geração de riqueza e lucro. Não se defende estatização em nenhum sentido, por ser nociva.
Porém, a Constituição da República de 1988, em dois momentos distintos, nos arts. 5º, inciso XXIII, e 170, inciso III, logo após garantir o direito de propriedade (incisos XXII e II dos arts. 5º e 170, respectivamente), prescreveu a necessidade de ser observarda a função social na atividade econômica.
Está claro que o texto constitucional vigente no país, impõe como princípio da ordem econômica a função social dos bens econômicos.
Há, portanto, uma sintonia com o entendimento do G20.
Espera-se que a decisão da reunião de Roma não fique no papel e seja realmente um instrumento de valorização econômica e social, em benefício do ser humano no planeta.