Postado às 05h15 | 05 Jan 2024
Ney Lopes
Por ter sido parlamentar federal durante 24 anos, considero-me legitimado para analisar atos do Congresso Nacional, apoiando ou não.
Parece-me ser essa a melhor forma de aperfeiçoar as instituições livres, ao invés da insanidade de quem somente protesta e propõe até fechamento.
Todos sabem a minha intransigente defesa da classe política, como elemento indispensável à governabilidade democrática.
Todavia, no recente caso específico de alguns vetos à Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), o presidente Lula agiu certo.
O Congresso Nacional está indo além dos seus limites constitucionais.
O presidente vetou trechos sobre a criação de um “calendário obrigatório”, que impõe prazos de até 30 dias para o executivo pagar as emendas parlamentares.
Vetou também inciso, no qual todo pagamento de fundos das áreas de Saúde e Assistência Social da União seria obrigatoriamente no primeiro semestre de 2024.
Note-se, que o “calendário obrigatório de pagamentos” foi aprovado conjuntamente com a escandalosa quantia de R$ 53 bilhões para que os parlamentares em 2024 mantenham, pelo dinheiro liberado, os seus redutos eleitorais.
Isto significará cada deputado dispondo de cerca de 38 milhões e cada Senador, em torno de 70 milhões para favorecimentos ao seu bel prazer.
Há quatro tipos de emendas parlamentares: as “emendas do relator” aquele que produz o relatório geral do Orçamento; “Emendas de bancada”: para interesses de cada estado. “Emendas de comissão”: das comissões técnicas da Câmara e Senado. “Emendas individuais”: de cada deputado ou senador, cada um podendo apresentar até 25 emendas individuais.
No ano de 2015, deputados e senadores transformaram as suas emendas individuais em impositivas.
No período de Rodrigo Maia como presidente da Câmara, as emendas de bancada assemelharam-se às individuais e passaram a ser também impositivas, com o momento de pagar estabelecido pelo governo.
A ampliação do uso das emendas do relator no período Bolsonaro, colocou parte considerável da gestão do Orçamento federal nas mãos do Legislativo.
Ainda no governo Bolsonaro, os valores em geral das emendas passaram a ser astronômicos, o que levou o STF a considerar inconstitucional, em 2022.
Os vetos do presidente Lula tentam evitar que a gestão e execução orçamentária referentes às emendas fiquem no âmbito do Legislativo.
A LDO e a Lei de Responsabilidade Fiscal preveem que compete ao Executivo estabelecer a programação financeira e cronograma do desembolso de recursos.
Os vetos serão levados ao Congresso e provavelmente cairão pelos interesses dos parlamentares num ano eleitoral.
Em consequência, esse calendário obrigatório comprometerá ainda mais parte do orçamento público e aumentará o poder isolado do Congresso.
A regra é de que os poderes sejam independentes e harmônicos entre si (artigo 2° da CF).
É correta a obrigação do executivo pagar as emendas parlamentares.
Porém não significa, o Legislativo "garrotear" o Executivo, a quem cabe a execução orçamentária, impondo datas aleatórias para o pagamento das emendas, sem levar em conta a disponibilidade de recursos.
Neste caso, caracteriza-se modelo irracional, em relação ao gasto público.
Por tais motivos, o Congresso não tem razão, ao negar esses princípios.