Postado às 06h02 | 21 Nov 2023
Ney Lopes
A expressão “pisar na bola” significa decepcionar, não fazer o que foi combinado.
O ex-presidente Bolsonaro e o presidente Lula “pisaram na bola”, em declarações recentes.
Vejamos.
Bolsonaro afirmou que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, “dá suas escorregadas políticas”.
Continuou: “Eu jamais faria certas coisas, que ele faz com a esquerda. Eu não tiraria fotos juntos. Aí eu sou radical. O que eu tenho a ganhar com o Haddad, meu Deus do céu? O que eu tenho a ganhar com o pior prefeito de São Paulo? Nada”.
Ponto questionado pelo ex-presidente foi o governador de SP ter dito que concordava “com 95% da reforma tributária em tramitação, proposta pelo governo federal”.
De outro lado, o presidente Lula desdenhou publicamente da meta fiscal proposta pelo ministro Haddad e engrossou “fogo amigo” contra ele.
Sabe-se que Haddad tenta se equilibrar entre promessas de responsabilidade fiscal, para atrair boa vontade do mercado financeiro, e as expectativas das alas mais à esquerda do PT, que não veem necessidade de controle de gastos
É realmente uma relação tumultuada com o PT, que é contra a política de déficit zero do Ministro da Fazenda.
Para agradar o “radicalismo” de alas do PT, Lula chegou a desautorizar Haddad, declarando que "a meta de resultado primário não precisa ser zero. Muitas vezes o mercado é ganancioso demais e fica cobrando uma meta que eles sabem que não vai ser cumprida".
Haddad não desistiu e mostrou ao presidente todos os ganhos para a economia com a manutenção da meta estabelecida pelo ministro para 2024, no âmbito do novo arcabouço fiscal.
Lula parece ter entendido os argumentos, embora Haddad continue evitando falar publicamente sobre o tema, para evitar confrontos políticos.
Em verdade, dois comportamentos – de Bolsonaro e de Lula - desafiam a lógica..
Ambos haviam concordado anteriormente com as propostas e estilo político do ministro e do governador de SP.
Ao ser eleito, Tarcísio de Freitas declarou em entrevista: “Comungo das ideias econômicas, principalmente do governo Bolsonaro. A valorização da livre iniciativa, os estímulos ao empreendedorismo, a busca do capital privado, a visão liberal. Sou cristão, contra aborto, contra liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra ideológica, política e cultural”.
Em 5 de julho, o governador disse concordar com 95% da reforma tributária que tramitava.enviada pelo governo.
Após a aprovação, elogiou ao dizer que São Paulo “ganha com a reforma tributária na uniformização de alíquota, com o fim da guerra fiscal, com o fim dos créditos fixos, dos créditos outorgados”.
Com esse clima de diálogo, SP evitou choques com o governo federal.
Isto, entretanto, não significou que o governador Tarcísio de Freitas “escorregou” como acusou Bolsonaro.
Veja o exemplo.
Lula deu uma guinada pró-Estado e não prevê privatizações em SP.
O governador discordou e cederá o controle da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, Sabesp, à iniciativa privada, devendo fazer o mesmo com o Porto de Santos, nos limites do que dispuser a lei.
A forma de comunicação de Tarcísio é muito mais suave em comparação com a agressividade de Bolsonaro e dos filhos dele.
Um exemplo desse maior “jogo de cintura” foi o recuo de Tarcísio no tema das câmeras corporais adotadas pela polícia de São Paulo no governo anterior, de João Doria, que resultaram em redução da violência policial.
Durante a campanha, ele adotou um discurso bolsonarista contra um controle maior das polícias e disse que acabaria com o uso desse instrumento, mas acabou mantendo as câmeras, diante da repercussão ruim.
Age pelo bom senso.
Com relação a preocupação de Haddad de controlar as contas públicas é totalmente de acordo com as regras econômicas globais.
O déficit público permanente compromete qualquer governo e aumenta o sacrifício da população.
O déficit é uma situação onde o estado gasta mais do que está recebendo.
Do ponto de vista do governo, seria uma situação onde um governo gasta mais em um ano do que ele gera de receita nesse ano.
Torna impossível administrar o interesse coletivo.
Mesmo sendo dificil alcancar essa meta, ela deve ser mantida, por uma questão de credibilidade do governo.
Total e absoluta heresia o que diz a deputada federal Gleisi Hoffmann, presidente do PT, que “o país "não pode ter meta fiscal zero e fome mil", sinalizando que a busca exagerada pelo equilíbrio fiscal pode prejudicar os mais pobres.
A tese da petista significaria um reequilíbrio mais tardio da dívida pública, com impacto negativo sobe o dólar, a inflação e a taxa Selic.
Os mais pobres sofreriam – como sofrem na Argentina –, com as finanças públicas se deteriorando e ficando sem controle.
Como se vê, foram infelizes as declarações do “ex” e do “atual” presidente.
Lula recuou e confirmou o déficit zero, proposto por Haddad.
Quanto a Bolsonaro, ele terá que compreender o estilo correto do governador Tarcísio de Freitas e que o radicalismo político nada constrói, tendo sido essa uma das principais razões da sua derrota em 2022?
Quando entenderá isto?