Postado às 04h51 | 30 Jun 2020
Guga Chacra
Ao lermos sobre as possíveis fraudes acadêmicas do novo ministro da Educação, lemos termos como “mestrado”, “doutorado” e “pós-doutorado”. Quem não está no ambiente acadêmico muitas vezes não entende a diferença. Inclusive, há uma ideia equivocada de que o “Pós-Doutorado” seria maior do que o doutorado. Também é preciso diferenciar os sistemas acadêmicos dos diferentes países. Eu conheço bem o americano e tentarei explicar aqui.
Nos Estados Unidos, chamamos as graduações na faculdade de “undergrad” – algo como pré-graduação. Dura quatro anos. De forma genérica, falamos “college”. Diferentemente do que ocorre no Brasil, você não precisa necessariamente escolher qual será a sua graduação. Pode escolher ao longo do curso. Quando se formar, dirão que você teve o “major” em determinada área. Por exemplo, literatura francesa ou química. Alguns estudantes optam por ter um double major – economia e ciência política, por exemplo. Há ainda a possibilidade de ter um "major" em uma carreira e um "minor" em outra.
Não há graduações em direito, medicina e odontologia na faculdade. Você não estuda estas carreiras nos quatro anos de "college". Estes cursos são ministrados nas chamadas “Grad Schools”. Para se formar nestas carreiras, você precisa ter concluído o "undergrad" antes e se candidatar para uma escola de direito, medicina ou odontologia na mesma universidade ou em outra, o que é até mais comum. Vou tentar explicar com um exemplo.
O ex-presidente Barack Obama se graduou em ciência política na Universidade Columbia, de Nova York. Posteriormente, ele estudou direito em Harvard. No seu CV, você verá que está BA em Columbia e JD em Harvard. O BA significa bacharel. O JD significa Juris Doctor (grau concedido a um estudante formado em direito). São três anos de estudo de direito, além dos 4 anos de college anteriores. Portanto, ao todo, o estudante passa sete anos na universidade para se formar em direito. Para ficar claro, não é obrigatório ir diretamente da faculdade para a escola de direito e é comum a pessoa trabalhar alguns anos e posteriormente ir estudar direito.
O processo para medicina é similar, com a diferença de durar quatro anos. Você conclui a faculdade e aplica para a Escola de Medicina. Muitos estudantes, na faculdade, optam por estudar pre-Med, mas não é obrigatório. A pessoa pode ser graduada em biologia e mesmo literatura. Neste caso, porém, terá de fazer créditos adicionais em áreas científicas. Ao se formar, terá o grau de MD (Medical Doctor). Ao todo, somados os quatro anos de "college" com os quatro de medicina, são 8 anos de estudo em universidade.
As “Grad Schools” não se restringem a medicina, direito e odontologia. Os chamados MBAs são em Grad Schools também. Muitas vezes, chamam as escolas de "Business Schools". Você se gradua em qualquer carreira no "college" e, anos depois, após alguma experiência profissional, decide obter um MBA. Há também os MA (Master of Arts), em humanas, e MS (Master of Science), em científicas e exatas, que duram dois anos.
Já o Master of Philosophy (MPhil), nas universidades americanas, costuma ser sinônimo do período que o estudante faz os créditos e os exames durante o doutorado (PhD). Após concluir o MPhil, a pessoa começa a escrever a sua tese de doutorado. Uma vez aprovada por uma banca, a pessoa se torna um PhD. Vale ressaltar que, apesar do nome, MPhil é a denominação usada para todas carreiras. Na maior parte das universidades, o estudante não recebe o grau de MPhil independente do PhD.
Sei que agora talvez surjam as dúvidas da diferença entre MA e MS em relação ao MPhil. A pessoa faz o MA normalmente com ambições profissionais e não acadêmica. Alguém que tenha cursado o mestrado em relações internacionais na Universidade Columbia ou em Georgetown costuma seguir carreiras no Departamento de Estado, CIA, consultorias, instituições multilaterais, ONGs, bancos e imprensa. Já alguém que queira seguir carreira acadêmica nesta área normalmente fez um PhD (doutorado) – muitas vezes, em ciência política com foco em relações internacionais. Nada impede que alguém com um MA faça um PhD. Mas terá de fazer a parte do MPhil, com algumas equivalências de crédito.
Importante notar que também há mestrado e doutorado em medicina, odontologia e direito, mais ou menos nos moldes acima. São voltados normalmente para quem quer seguir carreira acadêmica. No caso do direito, existe o LLM (Master of Laws), que costuma ser voltado para estrangeiros formados em direito em seus países. Dura um ano. Com o diploma, dependendo do Estado, este formando no LLM pode fazer a prova do BAR (equivalente à OAB) e exercer a função de advogado nos EUA, caso consiga o visto de trabalho.
Resumindo, o mais elevado grau acadêmico é o PhD, chamado de doutorado no Brasil. Sem ter aprovada a tese, você não é um PhD. Seria o caso do ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli. Ele não pode ser chamado de PhD porque não foi aprovado no seu doutorado em Rosário. E o pós-Doutorado? Primeiro, não se trata de um grau acadêmico SUPERIOR ao PhD. Trata-se de algo apenas POSTERIOR e costuma ser uma pesquisa ou algo do gênero dando continuidade à carreira acadêmica, sem necessidade de defesa de tese. No CV, vale mais o PhD do que o chamado “Post-Doc”. Em segundo lugar, o ministro não concluiu seu PhD e, portanto, não poderia ter feito “Post-Doc”. Por último, a universidade alemã onde ele diz ter feito o "Post-Doc" já indicou que a informação não é verdadeira.
Antes de terminar, os cursos de graduação nos EUA (undergrads) são ministrados em Liberal Arts Colleges ou em universidades. Já as Grad Schools existem apenas nas universidades, como Yale, Princeton, Stanford e centenas de outras ao redor do país.
Obs.: O sistema acadêmico brasileiro é distinto do americano. Direito, medicina e odontologia são graduações. Mestrados se dividem entre latus sensu e strictu sensu. Muitos doutorados são iniciados apenas após a conclusão do mestrado. Nos EUA, o estudante pode ir direto da faculdade para o PhD, já que o MPhil está embutido.