Postado às 09h37 | 25 Fev 2022
Ney Lopes
Jornal "Tribuna do Norte"-RN
O poeta João Guimarães Rosa, ao tomar posse na Academia Brasileira de Letras disse que há pessoas, que não morrem. Ficam encantadas. Morrem para provar que viveram.
Estando longe de Natal, em visita a familiares em Orlando (USA), tive essa sensação, ao receber consternado, a notícia de que o amigo José Rocha falecera, ou melhor, encantou-se.
O seu estilo de “viver de bem com a vida”, cultivando a amizade e a solidariedade, perpetuarão a sua imagem de um homem de bem, magistrado zeloso e amigo leal.
Conheci José Rocha como jovem repórter do jornal A ORDEM e estudante de direito em Natal, no início dos anos 60, quando fazia a cobertura dos trabalhos da Assembleia Legislativa do RN e ele era deputado estadual.
Consolidamos sólida amizade.
Posso dizer que participei dos primeiros comícios políticos da minha vida a convite dele, na campanha do seu pai o líder político do agreste Adauto Ferreira da Rocha, candidato a prefeito no município de Várzea.
Era recebido pela fidalguia da sua mãe Dona Marluce Vasconcelos da Rocha.
A luta política era renhida no agreste, com Adauto Rocha udenista ferrenho, adversário de José Lúcio, do PSD de JK.
O velho Adauto foi prefeito de vários municípios da região, deputado estadual por duas legislatura e presidente da Assembleia Legislativa.
Outra afinidade com José Rocha foi a torcida pelo América Futebol Clube.
Ele mais jovem, sempre estava ao lado de Heriberto Bezerra, Humberto Nesi e outros “americanos” históricos, nas tardes ensolaradas do Juvenal Lamartine e na administração do Clube.
Em entrevista em outubro de 2021, declarou que “depois da minha família, o América é a minha grande paixão”.
Iniciante nos palanques políticos pelas mãos de José Rocha, nos reencontramos na disputa político-eleitoral, em 1966.
Em plena efervescência revolucionária realizaram-se as primeiras eleições para o Congresso e Assembleias estaduais, após 1964.
Eu tinha 21 anos de idade.
Estudava na Faculdade de Direito do Recife, cidade para onde fora, a convite do jornalista Calazans Fernandes, trabalhar como repórter especial no Jornal do Commércio (JC), depois Diário de Pernambuco, JB e Folha de São Paulo (sucursal do Nordeste).
Tudo aconteceu, após Calazans me revelar que o deputado Odilon Ribeiro Coutinho mandara me convidar para ingressar como fundador do MDB, liderado nacionalmente pelo deputado Ulysses Guimarães e ser candidato a deputado federal no RN.
Odilon disputaria o Senado, após ter recusado a proposta de ingressar na Arena, com reeleição garantida, para liderar a resistência política à Revolução de 1964.
Aceitei disputar eleição, na oposição à Revolução de 31 de março, com as tropas de repressão nas ruas.
José Rocha também se candidatou a deputado federal.
Fui chamado para dar explicações de discursos proferidos na campanha pelo QG do Exército e o DOPS-RN.
Faltou pouco para o partido eleger um federal.
No final, o quociente eleitoral não foi atingido.
A grande recordação do amigo José Rocha foi a sua incansável luta em Brasília para a criação do nosso Tribunal Regional do Trabalho, contando com o permanente apoio do conterrâneo Francisco Fausto Paula de Medeiros, então ministro do TST.
Era à época deputado federal e fui o relator do projeto de lei na CCJ, que transformou o sonho em realidade.
Dediquei-me a essa causa na Câmara Federal.
De repente, surgiu um obstáculo, que tornaria impossível a legalização do 21° TRT-RN.
Exigia-se o critério mínimo de 20 juntas de conciliação por Estado para criação do Tribunal.
O RN tinha apenas 15 juntas.
O parecer da Comissão de Finanças seria da deputada paulista Zulaiê Cobra (PSDB).
Mostrei a colega, que na prática o estado tinha potencial para 22 juntas, o que iria além do limite exigido.
Ela se convenceu e vencemos o primeiro round.
Logo depois era sancionada a lei 8215, de 25 de julho de 1991, que criou o nosso TRT.
Em 16 de junho de 1992 realizou-se a sessão solene de instalação do Tribunal, com a presença do ministro presidente do TST, o gaúcho Guimarães Falcão, que se tornou, desde o primeiro momento, solidário com a reivindicação do nosso estado.
Até hoje o TRT-RN dá segurança e rapidez nos litígios, injeta dinheiro na economia e forma quadro de magistrados, procuradores e servidores de alto nível nível.
Acendo uma vela votiva em homenagem póstuma ao amigo José Rocha.
A última vez que o vi foi em 30 de novembro passado, quando pessoalmente ele me abraçou, ao lado da urna funerária, onde jazia o meu filho Ney Júnior.
Que Deus proteja os dois na Eternidade, dando-lhes a Paz merecida.