Postado às 05h35 | 29 Abr 2020
O Brasil viveu nos últimos dias cenas políticas dramáticas e preocupantes, após as demissões dos Ministros da Saúde e da Justiça. Nada se compara, ao que o país assistiu na última segunda, 27.
O Presidente Bolsonaro transferiu ao ministro da Economia, Paulo Guedes, o “status” de “czar” da economia, ao declarar de alto e bom som: "O homem que decide economia no Brasil é um só, chama-se Paulo Guedes. Ele nos dá o norte, nos dá as recomendações e o que nós realmente devemos seguir".
Até se justificaria demonstração pública de coesão da equipe econômica, para acalmar os mercados e desmentir boatos. Entretanto, o que houve foi total “capitis diminutio” (diminuição ou perda de autoridade), contrastando com as afirmações recentes, de que “quem mandava era o Presidente”.
Nota-se que, segundo afirma editorial do “Estado”, Bolsonaro com fisionomia transtornada, “acuado por investigações e ameaçado por graves denúncias“, dobrou-se às pressões do Ministro Guedes, que o teria colocado contra a parede, diante do país não suportar nova crise política.
O Presidente já cometera o mesmo erro ao prometer “carta branca” à Moro, esquecendo a lição de que “não se nomeia, quem não se pode demitir”.
A primeira vítima de Guedes foi humilhar os servidores públicos, declarando à Folha, que eles “não deviam ficar em casa, trancados com geladeira cheia, assistindo a crise”.
O “czar” atribui, que os “servidores são parasitas” e se locupletam de vantagens indevidas. Desconhece o mérito de categoria, que na pandemia tem contribuído com relevantes serviços prestados à nação.
O serviço público tem distorções. Ninguém nega. Por que o Ministro não sugere que os pagamentos, a qualquer título, não ultrapassem o “teto constitucional”, retiradas todas as demais vantagens, inclusive auxílios moradia, automóvel particular, passagens aéreas, seguro saúde, alimentação e outros concedidos, inclusive aos Ministros de Estado?
Só isso geraria grande economia. Entretanto, por ter ojeriza ao servidor público, ele só mira sacrifício generalizado no vencimento mensal do funcionalismo, desconhecendo o mérito da categoria, que na presente pandemia tem dado demonstrações de relevantes serviços prestados.
Está claro o seu desejo em debilitar o Estado e entregar o comando social às forças do mercado.
Vários fatores contribuíram para melhoria da economia no atual governo, apesar do temperamento autoritário de Guedes ter gerado tensões, como em maio de 2019 ao rebelar-se contra opiniões contrárias às suas, disparando em tom grosseiro: “Pego um avião e vou morar lá fora. Já tenho idade para me aposentar”.
Outro exagero autoritário ocorreu com a forma descortês e autoritária como o Ministro se dirigiu recentemente ao nosso conterrâneo Rogério Marinho, Ministro do Desenvolvimento Regional.
Ao saber da sugestão de um Plano de recuperação pós pandemia, chamou Rogério de “traidor”, simplesmente porque qualquer iniciativa teria que partir do “czar”. O ministro Rogério, demonstrando sensibilidade social, preocupou-se com o recomeço de milhares de obras inacabadas, sobretudo em áreas carentes do país. Sem dúvida, uma medida oportuna, por gerar empregos e reduzir desigualdades regionais.
Com tal perfil onipresente será que Paulo Guedes aceitará dividir o “ônus da crise da pandemia” com todos os segmentos sociais, ou irá continuar na ótica, de que sempre “quem o paga o pato” é o “andar de baixo”, representado pelos assalariados, funcionários, pequenos e médios empreendedores e pequenos agricultores?
Tudo isto acontece, quando o mundo caminha para a reorganização dos Estados nacionais, com novo modelo propenso às funções sociais prioritárias e readequações do capitalismo, que sobreviverá em nova modelagem, no qual o serviço público é essencial.
No “pós” I Guerra Mundial, nasceu o Estado de bem-estar social (“welfare state”), pela via de um pacto social “tripartite”: governo, empresários e trabalhadores.,
No final da II Guerra, avançou a concepção de Estado Social, através das ideias do economista inglês John Maynard Keynes, que defendia ajustes, diante do contexto econômico marcado por monopólios e concorrência imperfeita.
Agora, a pergunta no ar é se o Ministro Paulo Guedes, entronizado “czar” da economia, continuará insistindo nas mesmas teorias de Milton Friedman, hoje contestadas, até na própria Escola de Chicago, onde ele estudou?
A apreensão é que, tendo o Presidente da República abdicado do seu comando, nenhuma correção de rumos possa ser feita, em razão da “caneta” ter mudado de dono.
Só resta aguardar!