Notícias

Moraes: Planalto não pode suspender quarentena determinada por estados e municípios

Postado às 05h19 | 09 Abr 2020

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu medida cautelar em ação ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para reconhecer e assegurar a atuação de estados e municípios na adoção de medidas restritivas durante a pandemia, como isolamento social, quarentena e restrições de comércio, independente de ato do governo federal em sentido contrário.

A decisão foi proferida no âmbito da ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) 672, na qual a OAB pediu que o presidente da República Jair Bolsonaro “se abstenha de adotar medidas contrárias às orientações das autoridades sanitárias nacionais e internacionais”.

Leia a íntegra.

Na decisão, o ministro destaca que “não compete ao Poder Executivo Federal afastar, unilateralmente”, decisões de governadores e prefeitos que “adotaram ou venham a adotar, no âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, como demonstram a recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários estudos técnicos científicos”.

Moraes diz que em momentos de crise, como o atual, “o fortalecimento da união e a ampliação de cooperação entre os três poderes, no âmbito de todos os entes federativos, são instrumentos essenciais e imprescindíveis a serem utilizados pelas diversas lideranças em defesa do interesse público”, com respeito aos mecanismos constitucionais e manutenção da harmonia e independência entre os Poderes, “que devem ser cada vez mais valorizados, evitando-se o exacerbamento de quaisquer personalismos prejudiciais à condução das políticas públicas essenciais ao combate da pandemia de COVID-19”.

Entretanto, o ministro diz que o que se vê no país atualmente não é isso. “Lamentavelmente, contudo, na condução dessa crise sem precedentes recentes no Brasil e no Mundo, mesmo em assuntos técnicos essenciais e de tratamento uniforme em âmbito internacional, é fato notório a grave divergência de posicionamentos entre autoridades de níveis federativos diversos e, inclusive, entre autoridades federais componentes do mesmo nível de Governo, acarretando insegurança, intranquilidade e justificado receio em toda a sociedade”, destaca.

Moraes diz que não cabe ao STF substituir o juízo discricionário do Executivo e determinar ao presidente da República a realização de medidas administrativas específicas. Entretanto, lembra que o caráter discricionário das medidas realizadas pelo presidente da República, bem como de suas eventuais omissões, “é passível de controle jurisdicional, pois está vinculado ao império constitucional, exigindo a obediência das autoridades ao Direito, e, em especial, ao respeito e efetividade aos direitos fundamentais”.

O ministro concorda com a OAB apenas em relação ao pedido de concessão de medida liminar para que seja determinado o respeito às determinação dos governadores e prefeitos quanto ao funcionamento das atividades econômicas e as regras de aglomeração.

“Não compete ao Poder Judiciário substituir o juízo de conveniência e oportunidade realizado pelo Presidente da República no exercício de suas competências constitucionais, porém é seu dever constitucional exercer juízo de verificação da exatidão do exercício dessa discricionariedade executiva perante a constitucionalidade das medidas tomadas, verificando a realidade dos fatos e também a coerência lógica da decisão com as situações concretas”, diz o ministro.

“Se ausente a coerência, as medidas estarão viciadas por infringência ao ordenamento jurídico constitucional e, mais especificamente, ao princípio da proibição da arbitrariedade dos poderes públicos que impede o extravasamento dos limites razoáveis da discricionariedade, evitando que se converta em causa de decisões desprovidas de justificação fática e, consequentemente, arbitrárias”, continua.

O ministro pondera que os princípios da separação de poderes e o federalismo, cláusulas pétreas da Constituição Federal, são essenciais na interpretação das normas recentes que tratam sobre o combate à pandemia da Covid-19, como a Lei 13.979/20, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus, e o Decreto Legislativo 6/20, por meio do qual se reconhece o estado de calamidade pública, e dos decretos presidenciais 10.282 e 10.292, que definem os serviços públicos e as atividades essenciais.

Assim, Moraes concedeu parcialmente a medida cautelar para reconhecer e assegurar o exercício da competência concorrente dos governos estaduais e distrital e suplementar dos governos municipais, cada qual no exercício de suas atribuições e no âmbito de seus respectivos territórios, “para a adoção ou manutenção de medidas restritivas legalmente permitidas durante a pandemia, tais como, a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outras; independentemente de superveniência de ato federal em sentido contrário, sem prejuízo da competência da União para estabelecer medidas restritivas em todo o território nacional, caso entenda necessário.

Por fim, o ministro ressaltou que a validade formal e material de cada ato normativo específico estadual, distrital ou municipal poderá ser analisada individualmente.

O presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, elogiou a medida cautelar. “A decisão do ministro Alexandre de Moraes mostra a firmeza do STF na defesa da nossa Constituição, dos princípios da Federação, da independência e harmonia entre os Poderes e, acima de tudo, uma vitória do bom senso na luta contra nosso único inimigo no momento: a pandemia que ameaça a vida de milhares de brasileiras e brasileiros”, afirmou.

Deixe sua Opinião