Postado às 06h54 | 16 Dez 2021
O STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria para estabelecer que os residentes do Brasil que deixarem o país a partir desta quarta-feira (15) poderão retornar se comprovarem que tomaram o imunizante contra a Covid-19, ou se fizeram quarentena de cinco dias e apresentarem teste negativo.
Assim, a decisão deixa margem para residentes que deixarem o país a partir desta quarta retornarem mesmo sem o comprovante da imunização.
Os ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Luiz Fux votaram para acompanhar o voto de Barroso.
O julgamento ocorre no plenário virtual e os demais magistrados têm até quinta-feira (16) para incluírem seus votos no sistema.
A manifestação do Supremo também permite a entrada, sem vacina, de quem não pode receber as doses por razões médicas, menores de 12 anos e quem chega de países sem imunizantes disponíveis.
Com a decisão, o governo terá de refazer a portaria com regras sobre o controle de fronteiras. Mas as manifestações de Barroso, acompanhadas pelos colegas da corte, deixaram dúvidas sobre como cobrar e fiscalizar o comprovante de vacinação, e quais são as formas possíveis de barrar a entrada de um residente no Brasil.
A proposta de inserir o certificado da vacinação no controle de fronteiras, apresentada pela Anvisa em 12 de novembro, foi ignorada por quase um mês pelo governo, barrada pelo discurso negacionista do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Encurralado por questionamentos no STF e recomendação do TCU (Tribunal de Contas da União), o governo aceitou parte das recomendações da Anvisa em portaria publicada na última semana. Decidiu liberar, em aeroportos, a entrada de todos os não vacinados que cumprissem o isolamento e apresentassem teste negativo, como havia proposto a agência.
O Planalto, porém, desejava permitir que viajantes cruzassem a fronteira por terra apenas com o exame negativo em mãos, enquanto a agência cobrava barrar quem não estivesse imunizado.
A portaria do governo já previa, mas Barroso reforçou, em comunicado, que a companhia aérea deverá cobrar antes do embarque o certificado da vacina, o resultado do teste da Covid-19 e a DSV (Declaração de Saúde do Viajante).
Esta nota do ministro também ampliou as dúvidas no governo, pois foi lida como sinal de que mesmo residentes teriam de ser barrados, se não estivessem vacinados.
Por terra, o teste negativo e o comprovante da imunização são entregues às autoridades sanitárias ou migratórias.
De forma geral, técnicos do governo e da agência avaliam que a possibilidade de substituir o certificado de vacinação pela quarentena e teste é direcionada ao modal aéreo, onde é mais fácil acompanhar o viajante.
No quinto dia de isolamento, o viajante deve realizar novo exame para a Covid-19. Se o resultado for negativo, está liberado para circular no Brasil, senão tem de completar o ciclo de 14 dias de quarentena.
Na primeira decisão monocrática no caso, no último dia 11, Barroso apenas estabeleceu que residente do Brasil só poderia voltar ao país mediante comprovação de que tomou vacina contra a Covid-19. A medida previa dispensa da regra a quem apresentasse razões médicas que contra indicassem a imunização, ou para quem viesse de países que não tenham vacinas disponíveis.
Na segunda decisão, do dia 14 deste mês, ele decidiu que a exigência de passaporte de vacinação só valia para as pessoas que deixarem o país desta quarta-feira (15) em diante.
Em ambas as ordens judiciais, o ministro não mencionava a hipótese da quarentena e testagem como alternativa ao passaporte de vacinação para residentes.
No julgamento virtual em que a corte discute se referenda a decisão do relator, porém, Barroso passou a prever a possibilidade de quarentena e dupla testagem para autorizar a entrada no país.
Por meio de nota enviada à reportagem, o ministro disse que esse trecho do voto serve apenas para esclarecer que residentes do país não podem ser proibidos de entrar no Brasil.
"Para evitar interpretações equivocadas no sentido de que o STF proibiria a entrada de brasileiros sem vacinação no país, o ministro fez um acréscimo no voto que enviou a referendo no plenário virtual, para deixar claro que brasileiros e estrangeiros residentes no país sem comprovante não poderiam ser banidos ou proibidos de voltar para casa", disse.
O país é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, da OEA (Organização dos Estados Americanos), que "ninguém pode ser expulso do território do Estado do qual for nacional, nem ser privado do direito de nele entrar".
No voto, que já foi acompanhado pelos colegas, o ministro acrescenta a nova regra:
"Nada obstante, para não impedir de forma peremptória o reingresso de brasileiro ou estrangeiro residente no país, em caso de não exibição de comprovante de vacinação, serão exigidos: (i) apresentação de documento comprobatório de realização de teste de PCR ou outro aceito para detecção da Covid-19, bem como (ii) quarentena que somente se encerrará, com nova testagem negativa, nos termos do art. 4º, da Portaria Interministerial nº 661/2021".
A portaria a que ele se refere é a publicada pelo governo federal na semana passada, após recomendação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para que o país adotasse o comprovante de vacinação.
O ministro diz ainda que cabe às autoridades sanitárias regulamentarem o monitoramento e a fiscalização das medidas.
A entrada de brasileiros não vacinados no Brasil era o principal ponto de discórdia entre o Palácio do Planalto e o Supremo.
Auxiliares do presidente se queixaram da primeira versão de Barroso, e acreditavam que era uma forma de impedir Jair Bolsonaro (PL) de viajar ou de obrigá-lo a se vacinar, porque senão, não poderia entrar no Brasil.
Da forma como respondeu aos questionamentos da AGU (Advocacia-Geral da União) na noite de terça-feira, o ministro não abordava como proceder no caso de cidadãos que deixassem o Brasil depois de 14 de dezembro e que não tivessem como comprovar a vacinação - seja porque não se vacinaram, seja porque não conseguiram baixar comprovante no ConectSUS que permanece fora do ar.
"Deixo claro que brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, maiores de 12 anos, que deixarem o país após a data da presente decisão, ao regressar deverão apresentar comprovante de vacinação, juntamente com o restante da documentação exigida", diz a decisão do ministro.
Ele próprio chamou a medida de indutora da vacinação, para "evitar que na volta aumentem o risco de contaminação das pessoas que aqui vivem".
Depois, Barroso cita apenas o caso de quem não tenha comprovante da vacina e já tenha sido infectado com o coronavírus. "Não há base científica para tal exceção".
O presidente é um grande propalador desta tese. Bolsonaro sempre diz que vacinar é uma questão pessoal, e que ele próprio já teria anticorpos suficientes para se proteger de uma eventual nova contaminação, uma vez que já teve coronavírus.
Entretanto, estudos já comprovam que é possível se infectar mais de uma vez com a Covid-19, e que a vacina não visa impedir isso. O principal objetivo dos imunizantes é evitar que a doença se desenvolva de forma grave nas pessoas.
Em audiência na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (15), a diretora da Anvisa Meiruze Souza disse que o órgão cumpre a decisão transitória de Barroso e que espera a elaboração de uma portaria pelo governo para aperfeiçoar a fiscalização.
"A Anvisa aguarda a publicação da portaria pelo Ministério da Saúde, pela Casa Civil, pelo Ministério da Justiça e da Infraestrutura. Essa portaria vai esclarecer e trazer o melhor cenário de trabalho para a Anvisa, mas já estamos atuando", comentou.
O presidente da agência, Antonio Barra Torres, que também esteve na Câmara, disse que acompanha o julgamento do passaporte da vacina no STF. Segundo ele, as decisões dos ministros, até o momento, coincidem com as notas técnicas emitidas pelo órgão.
"À medida que a conclusão do Supremo Tribunal Federal ganha corpo no colegiado da corte Suprema, nós vamos identificando cada vez mais pontos em comuns com as notas técnicas da Anvisa que foram enviadas aos quatro ministérios, que também privilegiam, contemplam, marcam o eixo vacinal como sendo a medida principal do enfrentamento da Covid-19", afirmou.