Postado às 05h09 | 18 Mai 2021
Após revisão de oito diretrizes nacionais e internacionais para o tratamento da covid-19, um grupo de especialistas coordenado pelo Ministério da Saúde elaborou um documento em que contraindica cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina, ivermectina, colchicina e outros medicamentos que não têm eficácia contra a doença comprovada cientificamente para pacientes hospitalizados.
O documento foi apresentado à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) na semana passada e recebeu parecer favorável. Nesta segunda-feira, 17, foi aberta consulta pública para que o documento receba contribuições nos próximos dez dias.
O grupo autor das diretrizes é composto por um painel de especialistas sob coordenação de um departamento do ministério. O painel inclui médicos de diferentes especialidades, farmacêuticos e representantes da pasta federal, de universidades e de sociedades médicas, entre elas a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), a Associação Paulista de Medicina (APM) e a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).
"Alguns medicamentos foram testados e não mostraram benefícios clínicos na população de pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados, sendo eles: hidroxicloroquina ou cloroquina, azitromicina, lopinavir/ritonavir, colchicina e plasma convalescente. A ivermectina e a associação de casirivimabe + imdevimabe não possuem evidência que justifiquem seu uso em pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados nessa população", informa o documento, denominado "Diretrizes Brasileiras para Tratamento Hospitalar do Paciente com Covid-19".
Sobre hidroxicloroquina ou cloroquina, medicamentos amplamente divulgados pelo presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores, e o antibiótico azitromicina, o documento é enfático na contraindicação e apresenta motivos.
"Não há evidência de benefício seja no seu uso de forma isolada ou em associação com outros medicamentos; A cloroquina e a hidroxicloroquina não devem ser utilizadas, independentemente da via de administração (oral, inalatória ou outras)."
Desde o ano passado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já alertava para a ineficácia dessas medicações na luta contra o novo coronavírus, comprovada em um estudo publicado em outubro.
No documento do ministério, a exceção é para pacientes que já utilizam as medicações, por estarem em tratamento contra doenças reumatológicas ou malária, ou pessoas com quadros de infecção bacteriana, no caso do uso do antibiótico.
Também foram avaliados estudos com corticoesteroides e anticoagulantes. Seguindo a linha de estudos científicos, a dexametasona foi recomendada para pacientes em estado grave em uso de oxigênio suplementar. Os anticoagulantes são indicados "em doses de profilaxia para tromboembolismo venoso em pacientes hospitalizados com covid-19".
Coordenador do grupo que elaborou o documento, Carlos Carvalho, professor de pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), diz que a construção das diretrizes foi uma solicitação do ministro da Saúde Marcelo Queiroga diante de problemas como a falta de oxigênio, dos medicamentos para o kit intubação, da necessidade de proteger pacientes em ventilação mecânica e de oferecer orientações farmacológicas para pacientes internados.
Segundo ele, quatro capítulos já foram elaborados abarcando esses temas e outros três ainda serão elaborados, tendo como tema inclusive o atendimento pós-covid.
"Está agora em consulta pública para que todas as sociedades e médicos possam ler e fazer contribuições. Ao final, volta para nós e vamos gerar um documento final. Decidimos fazer essas recomendações para pacientes mais graves, abordando medicamentos para intubação para o médico que estiver na ponta poder executar essas manobras, estratégias de ventilação."
Carvalho diz que o documento tem como foco pacientes hospitalizados e não contempla indicações do uso precoce desses medicamentos, que também já mostrou não ter eficácia, mas espera que as recomendações sejam utilizadas em todas as fases da doença.
"A solicitação para nós é discussão para o ambiente hospitalar. Tem uma série de documentos e, no fim desse capítulo, tem um parágrafo que cita os medicamentos que não têm indicação e está citado cloroquina e hidroxicloroquina, mas isso não está mais em voga em lugar nenhum. Para hospitalizado, ninguém prescreve. É diferente de prevenção, mas eu espero que isso sirva para todo mundo. Já existem documentos do Ministério da Saúde, em março, que discutem o uso na fase pré-hospitalar. Tem de ver se o ministro vai querer revisar isso."
Depois da consulta pública, uma nova avaliação será realizada pela Conitec, que encaminhará um relatório com recomendações para o ministério fazer suas decisões sobre o tema.
Procurado, o Ministério da Saúde informou que "elabora orientação no tratamento de pacientes em quadros graves de covid-19, quanto ao uso adequado de oxigênio e suporte ventilatório, sedativos e bloqueadores neuromusculares, entre outros medicamentos", mas não comentou a contraindicação das medicações no contexto das diretrizes nem no suposto tratamento precoce.
Destacou apenas "a recomendação para que os pacientes procurem uma Unidade Básica de Saúde para atendimento médico logo nos primeiros sinais da covid-19" e disse que "a medida é fundamental para evitar casos graves da doença".