Postado às 10h40 | 21 Abr 2020
Globo
Falta de equipamentos básicos e respiradores; inexistência de testes para doentes, médicos e enfermeiros; Unidades de Pronto Atendimento (UPA) fazendo as vezes de UTI, porque os leitos de terapia intensiva estão saturados pela epidemia causada pelo novo coronavírus. O retrato atual do sistema público de saúde do Amazonas, onde corpos já foram deixados ao lado de pacientes, serve de alerta para outros estados.
Em São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará e Pernambuco, quarteto que lidera o ranking nacional de casos confirmados e mortes por Covid-19, a rede de leitos aproxima-se de seu limite. Ou seja, o cenário amazonense pode, em breve, ser replicado no Sudeste e no Nordeste. Segundo levantamento do Ministério da Saúde, o Brasil chegou ontem a 2.575 vítimas fatais do coronavírus entre 40.581 infectados.
Os relatos de Manaus foram feitos ao GLOBO por enfermeiros que estão na linha de frente do combate à epidemia, ouvidos sob a condição de anonimato.
— Estamos tendo de escolher quem vai respirar ou não — resume uma enfermeira, diante da falta de equipamentos básicos no Hospital João Lúcio, onde foram gravados vídeos de corpos deixados ao lado de pacientes com Covid-19.
De acordo com o governo do Amazonas, quase 90% dos leitos de UTI estão ocupados, numa demanda que ultrapassou a capacidade do hospital de referência para Covid-19, o Delphina Aziz, em Manaus. Foi necessário recorrer a outros hospitais, como o João Lúcio, que colapsou diante da quantidade de infectados. O estado tem a segunda maior incidência de infectados no país, com 415 diagnosticados por 1 milhão de habitantes.
Segundo um enfermeiro que trabalha em uma UPA da capital amazonense, a unidade está sendo obrigada a prestar o atendimento que seria de uma UTI:
— Não há como mandar mais para hospital de referência. Todas as unidades de média complexidade estão tendo de assumir os pacientes críticos, até que se abram vagas. No meu último plantão, recebemos nove pacientes. A gente já vive um colapso.
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Segundo uma enfermeira que trabalha no João Lúcio, onde câmaras frigoríficas foram providenciadas depois da revelação das cenas de pessoas mortas ao lado de pacientes, não há pessoal suficiente para o atendimento necessário:
— Na sala onde trabalho, são necessários cinco técnicos de enfermagem. Tem só um. Quando muito, dois.
Exames demoram um dia inteiro para serem providenciados. Não há máscaras de proteção para os pacientes. Aventais que deveriam ser descartáveis são esterilizados para serem reusados.
— A demanda está tão grande que o SOS Funeral, destinado a pessoas pobres, não tem condições de recolher todos os corpos. Como as famílias não têm condições financeiras de providenciar a retirada, os corpos ficam ali, ao lado de pacientes — afirma a enfermeira.
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Uma outra funcionária diz conhecer 12 colegas da enfermagem que foram infectadas pelo novo coronavírus. Ela diz que os profissionais não conseguem fazer o teste para detectar se têm Covid-19.
— Sabemos que estamos em uma guerra. O problema é estar em guerra sem nenhuma arma. A gente não tem equipamento de proteção individual — afirma ela.
O governo do Amazonas diz que está providenciando EPIs para os profissionais de saúde e mais leitos de UTI, além de reposição de profissionais por meio de convocações de concursados e abertura de novos processos seletivos. Os cinco hospitais da rede terão 1.023 leitos, conforme a Secretaria de Saúde. O Delphina Aziz, por exemplo, ativou 25 leitos de UTI e 20 leitos clínicos a mais, segundo a pasta.
No Rio, os leitos de UTI para pacientes com Covid-19 estão no limite. Enquanto o funcionamento dos hospitais de campanha depende do recrutamento de pessoal e equipamentos, já há filas de pacientes graves aguardando internação em unidades de saúde.
Às 17h30m, a Secretaria municipal de Saúde admitia que 90% dos 269 leitos do SUS para tratamento intensivo de adultos com coronavírus estavam ocupados. Ontem, o Hospital Universitário Pedro Ernesto, da rede estadual, estava com 100% das UTIs para Covid preenchidas. A prefeitura do Rio promete lançar amanhã edital para a contratação de mil leitos de terapia intensiva na rede privada.
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Os hospitais municipais de campanha de São Paulo chegaram ontem a 21% de ocupação. Os complexos do Pacaembu e do Anhembi têm, juntos, 231 pacientes internados. Ontem, o Anhembi registrou a primeira morte por coronavírus, um paciente de 79 anos — não foi informado se a vítima tinha doença preexistente. Em 12 de abril, o hospital Pacaembu registrou sua primeira morte, um homem de 36 anos com histórico de doença de Chagas.
O Hospital das Clínicas e o Instituto de Infectologia Emílio Ribas vêm sofrendo pressão: suas UTIs tinham mais de 90% de ocupação no domingo. A Zona Leste de São Paulo também preocupa: na semana passada, ao menos quatro hospitais da região tinham 100% de ocupação de UTI.
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O Ceará continua com lotação de 100% dos seus leitos de UTI destinados a pacientes infectados com o novo coronavírus. Para contornar o problema, a Secretaria da Saúde promete inaugurar até hoje 36 novos leitos para pacientes que precisam de tratamento intensivo.
A Secretaria de Saúde de Pernambuco informa que, somando os 319 leitos de sua rede e do SUS, a taxa de ocupação é de 95%. Entre os leitos de enfermaria, o número é de 83%.