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Estado: "A Federação em funcionamento"

Postado às 07h28 | 20 Abr 2020

Editorial do Estado de São Paulo

Por unanimidade, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que as disposições previstas na Medida Provisória (MP) 926/2020 devem respeitar a competência concorrente dos três níveis de governo da Federação em relação à saúde pública. “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”, diz o art. 23 da Carta Magna.

A MP 926/2020 modificou alguns trechos da Lei 13.979/2020, que trata das medidas para o enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. Com a decisão, o Supremo assegurou que Estados e municípios podem tomar providências normativas e administrativas relativas à pandemia, devendo a União respeitar as medidas estaduais e municipais.

A decisão é uma importante defesa da Federação, ao preservar o âmbito de atuação de cada ente federativo. Trata-se do explícito reconhecimento de que o poder estatal não está inteiramente centralizado na União. Tal realidade institucional, tantas vezes mal compreendida, como se fosse mero elemento complicador da atuação do Estado, tem profundo caráter democrático, ao garantir, tanto quanto possível, a proximidade do cidadão com o poder.

Além disso, a distribuição de poder que se dá numa Federação permite, esse é um dos motivos que fundamentam sua existência, uma atuação estatal mais eficiente. É o que se vê agora, no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. O conhecimento das circunstâncias locais, tais como o número de pessoas infectadas, o tamanho da equipe médica e a disponibilidade de leitos de UTI e de equipamentos médicos, é decisivo para a correta dosagem das medidas de isolamento social e de restrição da atividade econômica. Uma medida única para todo o País seria um completo desastre, além de ineficiente em termos de saúde pública.

A decisão do plenário do Supremo confirmou a medida liminar do ministro Marco Aurélio, proferida no mês passado no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 6.341, ajuizada pelo PDT. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio entendeu que a MP 926/2020 não afrontava a Constituição. “O que nela se contém não afasta a competência concorrente, em termos de saúde, dos Estados e Municípios”, disse o relator. Negou, assim, o pedido do PDT para que alguns dispositivos da MP 926/2020 tivessem sua eficácia suspensa. “Defiro, em parte, a medida acauteladora, para tornar explícita, no campo pedagógico e na dicção do Supremo, a competência concorrente”, lê-se na decisão liminar.

Na sessão de quarta-feira passada, o ministro Edson Fachin propôs explicitar que a União também pode legislar sobre saúde pública, com a condição de que o exercício desta competência resguarde a autonomia dos demais entes federativos. Com exceção do relator e do ministro Dias Toffoli, a maioria do plenário aderiu à proposta do ministro Edson Fachin, que faz referência direta ao artigo 3.º da Lei 13.979/2020. Nesse dispositivo, afirma-se que, “para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar no âmbito de suas competências”, entre outras medidas, o isolamento e a quarentena.

Na Adin 6.341, fica evidente que o exercício do poder dentro das respectivas competências não é empecilho para o enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. A atual situação emergencial não exige medidas de exceção ou poderes extraordinários, além dos limites legais. A melhor contribuição do Estado para o combate ao novo coronavírus é que cada esfera de governo – federal, estadual e municipal – atue dentro de suas competências, correspondentes a cada um dos Poderes. No caso, além de respeitar a competência do presidente da República de editar medidas provisórias, o STF cumpriu sua missão de defesa da Constituição, cujo primeiro artigo dispõe: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito”. Eis o leito que toda a ação estatal no combate à pandemia deve seguir. Não há vacina ou remédio fora dele.

 

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