Postado às 07h00 | 22 Set 2020
Diário de Notícias, Lisboa
Não há médicos nem enfermeiras suficientes em Espanha. A segunda vaga de covid-19 no país expôs ainda mais a escassez de profissionais de saúde no Sistema Nacional de Saúde (SNS) espanhol.
O diagnóstico é quase unânime e partilhado por sindicatos, sociedades médicas e até líderes políticos. A presidente da Comunidade de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, reconheceu-o esta segunda-feira: "Espanha tem um problema de falta de médicos e enfermeiras".
Na comparação com a OCDE, Espanha está acima da média em médicos de todas as especialidades. Porém, em termos de União Europeia fica muito abaixo da média ao nível de médicos de escolas primárias (76,5 contra uma média de 123,4 por 100 mil habitantes, de acordo com os dados mais recentes do Eurostat) e em enfermeiras (520 por 100 mil habitantes contra 840 na Europa).
Em resposta às perguntas dos jornalistas, o ministro da saúde Fernando Simón reconheceu esta segunda-feira que em alguns serviços existem "queixas crónicas de falta de recursos ou sobrecarga", embora não tenha podido especificar se é por falta de profissionais ou por deficiências organizacionais e de gestão. "Acho que neste momento já temos equipas suficientes para trabalhar, são os médicos que existem em Espanha. A primeira vaga passou com dificuldades, mas passou graças ao esforço desumano dos profissionais. Acredito que [a segunda vaga] não será tão difícil, mas é claro que gostaríamos de ter um número maior de médicos, porque em Espanha, tal como em todos os países, é limitado", acrescentou.
Essa escassez sanitária é atingida por várias deficiências. Uma delas é a precariedade crónica em que vivem muitos profissionais do SNS espanhol. Um estudo de 2016 da Organização Médica Colegial revelou que metade dos médicos do SNS espanhol não tem domicílio próprio. Destes, 40% assinaram contratos de menos de seis meses.
A contratação desses profissionais que estão na órbita do sistema resolveria parte do problema, mas não tudo, porque não são suficientes. Ayuso também destacou esta segunda-feira que o sistema não produz profissionais de saúde suficientes para ocupar o lugar dos que se reformam e que nos próximos anos isso vai aumentar, por isso pediu ao primeiro-ministro, Pedro Sánchez, incentivos para atrair médicos e enfermeiras. Ou para reter no país quem emigra perante tanta precariedade. O problema atinge sobretudo Madrid: segundo cálculos do sindicato CSIF, 70% das pessoas que concluíram a sua informação este ano na região da capital espanhola optaram por rumar a outra paragem devido a condições que qualificam de "lamentáveis".
Lorenzo Armenteros, da Sociedade Espanhola de Médicos Gerais e de Família, explica que para o bom funcionamento do sistema faltariam entre 4.000 e 6.000 médicos de família, ou seja, cerca de 14% dos que já existem. E isso sem uma pandemia envolvida. É o mesmo, a uma escala diferente, que acontece em Madrid. Julián Ezquerra, da Associação de Médicos e Graduados de Madrid, estima que a comunidade precisaria de 600 médicos de família e 150 pediatras, ou seja, 15% do total; apenas para cobrir utentes regulares e fornecer serviços de rotina.
Essa escassez de médicos também se faz notar nas unidades de cuidados intensivos, que já estão a sentir pressão. "Por mais que se aumentem as camas e ventiladores, são necessários médicos e enfermeiras para prestar cuidados", frisa María Bodí, coordenadora do Grupo de Trabalho de Planejamento, Organização e Gestão da Sociedade Espanhola de Medicina Intensiva.