Postado às 15h19 | 07 Jun 2020
Elio Gaspari
Adiante vão duas cenas dos últimos dias. Uma aconteceu no Central Park, em Nova York. A outra no bairro de Alphaville, em São Paulo (R$ 5.700 por metro quadrado).
25 de maio: Amy Cooper, com MBA pela universidade de Chicago, chefe do setor de seguros de uma firma de investimentos (US$ 70 mil anuais) passeava seu cachorro, solto, pelo parque. Christian Cooper (nenhum parentesco) disse-lhe que devia prender a coleira do bicho. Negro, ele vinha com um binóculo e observava os passarinhos. Ela se descontrolou, sacou o celular e chamou a polícia, dizendo que “um afro-americano está ameaçando minha vida”. Christian diplomou-se por Harvard em Ciencia Política. Também sacou o celular e gravou a cena. (O vídeo seria visto por 40 milhões de pessoas.)
No dia 28 Amy foi demitida. Desculpou-se, mas Christian recusou-se a encontrá-la.
Nesse mesmo dia o cabo Edson, da PM paulista, foi enviado a uma casa de Alphaville, atendendo a uma denúncia de violência doméstica. Enquanto conversava com a mulher, apareceu o marido, o joalheiro Ivan Storel. Em bolsonarês castiço, que repeliu o cabo:
“Você pode ser macho na periferia, mas aqui você é um bosta. Aqui é Alphaville, mano”,
“Eu ganho R$ 300 mil por mês”, “você é um merda de um PM que ganha R$ 1 mil.”
“Tenho uns 50 caras pra enfrentar você.”
Uma policial (que também foi insultada) registrou a cena.
Seis dias depois, Storel gravou um vídeo, reconheceu seu erro, revelou que está em tratamento psiquiátrico e que agiu sob o efeito de álcool e remédios. Disse que se envolveu “numa polêmica” com a polícia e pediu “perdão” a todos os policiais, inclusive aos que ofendeu.
Fica combinado assim. Tanto Amy Cooper como Ivan Storel vocalizaram preconceitos. Ela, de cor. Ele, de classe. Como o vírus, são preconceitos transmissíveis e estão por aí.
Entrevistado no programa de Fátima Bernardes, o cabo Edson mostrou-se surpreso pela viralização do vídeo e revelou que “não quis mostrar para a minha esposa e nem para os meus filhos porque não sabia como ia ser a reação deles”.
Intervenção militar
Num país com os mortos da Covid passando de 30 mil, mais de 12 milhões de desempregados, numa recessão histórica, “lunáticos” (palavras de Gilmar Mendes, falam em intervenção militar.
Tudo bem, mas vale lembrar uma cena ocorrida há alguns anos em Brasília.
Um çábio defendia seu projeto e tirou da manga o que supunha ser um grande argumento:
“Se fizermos isso, o Paraguai fica na nossa mão”.
Respondeu-lhe um sábio:
“E você faz o que com ele?”
Se o ministro da Esducassão reclamar de cansaço e pedir para ir embora, seu motivo será entendido.
O governador Wilson Witzel (Harvard Fake ‘15), deve se preocupar com possíveis confissões premiadas de pessoas que trabalharam no seu governo, ou mesmo de gente que bicava no entorno.
Seu nome está na roda desde janeiro, colocado por um atravessador de negócios paraibano.
O doutor Pedro Guimarães, presidente da Caixa, é um homem valente e tem 15 armas em casa.
O benefício de R$ 600 para os invisíveis foi aprovado no fim de março e só no fim de junho a Caixa se comprometeu a providenciar cadeiras para as pessoas que vão para as filas diante de suas agências.
E levaram três meses para perceber que os bípedes sentam.
As cores de Aras
O procurador-geral Augusto Aras fará história pelas suas falas e pelos seus silêncios, mas já conseguiu animar Brasília pela policromia de suas gravatas.
Com um presidente que usa casaca de gola redonda, a única curiosidade da indumentária dos hierarcas estava nos patacões que carregam nos pulsos. Os ministros Braga Netto e Augusto Heleno têm relógios de astronauta. O embaixador Ernesto Araújo carrega um patacão que parece ter até horóscopo. Chique, só o da ministra Tereza Cristina, de aço, que parece ser um Cartier.
Existem empresários e empresários. O restaurante La Casserole, tradicional casa de pasto do andar de cima, está comemorando seu 66º aniversário com uma campanha para arrecadar recursos, destinandos a fornecer refeições para 6.600 necessitados do Centro de São Paulo. Cada R$ 20 doados servirão para cobrir os custos de uma refeição. A iniciativa ajudará também as famílias de 50 funcionários, parceiros e fornecedores.
Com 192 doadores, já conseguiram R$ 52 mil. Um freguês deu R$ 4 mil.
Na outra ponta fica a Enel, concessionária de energia de São Paulo. Tendo retirado das ruas os funcionários que liam os relógio do consumo, cobrou R$ 7 mil ao Casserole, que está parado. A conta não deveria ter chegado a R$ 100, mas ela se baseou no consumo médio do último ano. Apanhada, ela promete compensar suas vítimas.
Astro rei
Lula recusou-se a assinar os manifestos em defesa da democracia e explicou: “Eu, sinceramente, não tenho condições de assinar determinados documentos com determinadas pessoas”.
Gleisi Hoffmann, presidente do PT, deu nome aos bois: Lula não poderia assinar um manifesto junto com Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, que não assinou coisa alguma.
Cada um assina o que quer, mas em 1941, quando a Alemanha invadiu a União Soviética, o primeiro ministro inglês Winston Churchill aliou-se imediatamente a Stalin e disse:
“Se Hitler invadisse o inferno, eu diria uma boa palavra a respeito do Diabo na Câmara dos Comuns.”
Churchill tinha horror aos comunistas e, uma semana depois, proibiu que a BBC tocasse seu hino, a Internacional.
Depois do vexame da nomeação e da exoneração do presidente do Banco do Nordeste do Brasil, Bolsonaro e sua Nova Política entregou ao Centrão as presidências da Fundação Nacional da Saúde e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Juntos, movimentam R$ 57 bilhões.
Com menos de dois anos de governo, o capitão está no quarto presidente do FNDE e até agora ninguém explicou quem preparou o edital viciado para a compra de 1,3 milhão de computadores, laptops e notebooks ao custo de R$ 3 bilhões. Pelo seu desenho, os 255 alunos de uma escola da rede pública mineira receberiam 300.020 laptops.
Outro dia o vice-presidente Hamilton Mourão defendeu as negociações com o Centrão e disse que “compete aos organismos de fiscalização cumprir seu papel e o ministro da área ficar em cima disso aí, para que está aí a Controladoria-Geral da União?”
Bingo. Foi a CGU que sentiu cheiro de queimado no edital e provocou a sua revogação. Continua faltando contar quem e como botou aquele jabuti na forquilha.