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Editorial do Estado: "O governo tropeça na reforma"

Postado às 05h09 | 22 Jul 2020

Editorial do Estado

O governo continua devendo seu projeto de reforma tributária, repetindo promessas e emperrando a tramitação de propostas já em discussão no Congresso. Há consenso, no Brasil, sobre a urgência de uma grande revisão do sistema de impostos e contribuições. A mudança é apontada como essencial para aliviar a produção e permitir o retorno a um crescimento seguro. Aí termina o consenso. O presidente da Câmara e o ministro da Economia divergem sobre a criação de um tributo parecido com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Bandeiras diferentes são defendidas por líderes da indústria, do comércio, dos serviços e da agropecuária.

Ao entregar ao Congresso a primeira fase de sua proposta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, começou a cumprir a promessa, feita no ano passado, de encaminhar uma reforma fatiada. Com esse passo o ministro propõe unificar o PIS e a Cofins numa Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o chamado IVA federal, com alíquota de 12%. É uma iniciativa notavelmente modesta. O ministro, afinal, é conhecido por sua retórica em defesa da simplificação do sistema. Quem esperava algo compatível com esse discurso deve ter-se decepcionado.

Sendo a simplificação um dos objetivos da reforma, a proposta agora apresentada pelo ministro da Economia nem vale uma discussão preliminar. O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) previsto na PEC 45, da Câmara dos Deputados, e na PEC 110, do Senado, substitui cinco tributos, cobrados pela União, pelos Estados e pelos municípios: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Além disso, como lembra o especialista Bernard Appy, citando trabalho do economista Bráulio Borges, o IBS pode elevar o Produto Interno Bruto (PIB) potencial em até 20 pontos porcentuais em 15 anos. Uma reforma limitada ao PIS/Cofins produziria no máximo um décimo desse efeito.

Ao avaliar a diferença entre as duas propostas é preciso considerar também um detalhe político e estrutural muito relevante. O projeto de criação do IBS inclui a absorção do tributo estadual mais importante, o ICMS, e permite eliminar sérias distorções nunca enfrentadas para valer.

Várias propostas de reforma tributária foram apresentadas nos últimos 20 anos. Nunca se tratou de forma completa da guerra fiscal entre Estados nem se reduziu de modo significativo o peso do tributo sobre a produção. Por seus vários defeitos, o ICMS tem-se mantido como um entrave à eficiência e à competitividade. Há uma oportunidade, agora, de eliminação desses problemas, até porque as características do IBS têm sido aceitas por secretários de Fazenda de todo o País.

Mas a demora do governo federal em apresentar uma proposta completa de reforma está longe de ser o fato mais preocupante. Muito mais grave é a insistência do ministro da Economia em defender um tributo com as características da CPMF, também conhecida em outros tempos como “imposto do cheque”. A figura desse tributo fantasmagórico foi desenhada de várias formas, desde o ano passado, mas nunca se conseguiu ocultar suficientemente sua real identidade.

Os defeitos da CPMF são conhecidos e indisfarçáveis. Esse é um tributo regressivo, isto é, socialmente injusto, e cumulativo. Sendo cumulativo, contamina toda a economia direta ou indiretamente, afetando sua eficiência. Mas é, sobretudo, uma aberração, porque incide, de fato, sobre a mera movimentação de dinheiro, sobretaxando operações ou valores já tributados. Não se trata, como às vezes se diz, de forma equivocada, de um imposto sobre transações financeiras. Esse tributo já existe e tem sentido econômico: é o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

O ministro da Economia defende essa aberração como forma de compensar a desoneração da folha de pessoal. Essa é uma confusão enganadora. Pode-se discutir a desoneração, mas esse objetivo de nenhum modo justifica a recriação de um monstrinho tributário. Se a compensação é necessária, o governo deve ser capaz de encontrar uma fórmula razoável. Será uma demonstração de seriedade.

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