Postado às 04h32 | 08 Jun 2020
Editorial do Estado
Mais uma vitória sinistra foi alcançada pelo presidente Jair Bolsonaro, em seu esforço para transformar o Brasil em pária internacional. Ele poderá continuar aplaudindo, seguindo e imitando seu grande guru, o presidente Donald Trump, mas terá de abandonar a ambição de um acordo comercial com os Estados Unidos, pelo menos enquanto houver maioria democrata na Câmara dos Representantes. A busca de qualquer parceria econômica mais estreita com “o Brasil do presidente Jair Bolsonaro” será rejeitada, informaram 24 deputados democratas da Comissão de Orçamento e Tributos da Câmara. A declaração foi expressa em carta dirigida ao chefe do Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR), embaixador Robert Lighthizer. O embaixador havia anunciado em maio, depois de uma conversa com o chanceler brasileiro Ernesto Araújo, a intenção de intensificar a cooperação econômica entre os dois países.
Na mesma data da carta, 3 de junho, o Parlamento holandês aprovou moção contrária ao acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, assinado em 2019 e ainda pendente de ratificação pelos países participantes. A devastação da Amazônia foi o principal argumento a favor da moção. Mas também houve referência a riscos para os povos indígenas. Políticos citados pela imprensa europeia, nas discussões sobre o acordo entre os dois blocos, têm apontado o governo Bolsonaro como inimigo do meio ambiente e dos direitos humanos.
Ameaças ao meio ambiente, aos direitos humanos e à democracia são listadas extensamente na carta enviada ao principal negociador comercial dos Estados Unidos, o embaixador Lighthizer. O presidente Jair Bolsonaro, segundo os deputados, tem uma longa e persistente história de “declarações depreciativas sobre mulheres, populações indígenas e pessoas identificadas por gênero ou orientação sexual, além de outros grupos”. O governo Bolsonaro, continua o texto, “demonstrou seu completo menosprezo por direitos humanos básicos, pela necessidade de proteger a floresta amazônica e pelos direitos e dignidade dos trabalhadores”.
O Brasil sob Bolsonaro, acrescentam os deputados, não estará preparado, de forma crível, para assumir os novos padrões de direitos trabalhistas e de proteção ambiental estabelecidos no Acordo Estados Unidos-México-Canadá. Negociar qualquer acordo comercial com o Brasil será perda de tempo, sustentam os autores da carta.
Mencionando detalhes da gestão Bolsonaro, o texto cita números do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe) sobre aumento das queimadas na Amazônia. Esses dados, poderiam ter lembrado os autores da carta, foram postos em dúvida pelo presidente Bolsonaro, no início de uma polêmica encerrada com a demissão do diretor do instituto, o físico Ricardo Galvão, respeitado internacionalmente.
Há um claro componente protecionista na atitude dos democratas. Eles acabam atribuindo aos produtores brasileiros “uma história de emprego de práticas desleais de comércio”. A acusação é vaga e a intenção de impedir uma concorrência maior aos produtores americanos é evidente. Além disso, os autores da carta confundem a atividade ilegal e ambientalmente danosa realizada na Amazônia com a produção agrícola eficiente e competitiva – a mais importante – nas áreas tradicionais.
O protecionismo é novamente favorecido, portanto, pelas atitudes e políticas do presidente Bolsonaro e de seus piores ministros. Nos Estados Unidos, assim como na Europa, os defensores de barreiras contra produtos brasileiros dispõem de amplo cardápio de argumentos – ambientalistas, políticos e relativos a direitos humanos – fornecido pelo presidente do Brasil. Detalhe importante, na Europa, como nos Estados Unidos, os críticos frequentemente se referem ao “Brasil do presidente Jair Bolsonaro”. Essa expressão é usada pelos deputados democratas. O parentesco ideológico do presidente brasileiro com seu líder americano pouco valerá diante da oposição desse grupo. Os Estados Unidos são muito mais que Donald Trump. Bolsonaro parece ignorar também isso.