Postado às 06h52 | 09 Mai 2020
Editorial da Folha
Ao abrir a sessão plenária do Supremo Tribunal Federal na quarta-feira (6), o ministro Dias Toffoli definiu a corte que preside como última trincheira da sociedade na defesa dos direitos assegurados pela Constituição.
Pregou a harmonia entre os Poderes, condenou as agressões sofridas por jornalistas numa manifestação de apoiadores de Jair Bolsonaro no domingo (3) e cobrou respeito às decisões do tribunal, alvo predileto da turba golpista.
Tratou-se de uma resposta adequada às provocações do presidente, ainda que tardia —como corretas e demoradas, por sinal, têm sido as reações de Toffoli.
Fazia dias que, inconformado com o veto do STF à nomeação de um apaniguado para o comando da Polícia Federal, Bolsonaro ameaçara desafiar a determinação judicial e atacara o ministro Alexandre de Moraes, que assinara a liminar.
Na segunda (4), coube ao ministro da Defesa, Fernando Azevedo, reiterar o compromisso das Forças Armadas com a Constituição, numa nota em que classificou a independência e a harmonia entre os Poderes como imprescindíveis para a governabilidade.
Embora manifestações políticas das Forças Armadas sejam inconvenientes numa democracia, ainda mais quando se referem às ações do chefe do Executivo, a nota revestiu-se de caráter tranquilizador.
À boca pequena, militares do primeiro escalão do governo vinham expressando desconforto com a ingerência do STF na escolha do novo diretor-geral da PF —e o próprio Bolsonaro vangloriara-se do apoio das Forças Armadas ao participar do ato insolente de domingo.
Reafirmar constantemente as balizas estabelecidas pela Constituição, como Toffoli e Azevedo fizeram nesta semana, é necessário para conter os instintos autoritários de Bolsonaro, que não cansa de desafiar esses limites.
Ele voltou a demonstrá-lo nesta quinta (7), ao liderar uma marcha patética na direção do Supremo para fazer uma visita surpresa a Toffoli, à frente de uma delegação formada por ministros e dirigentes de associações empresariais.
A encenação, transmitida por redes sociais, transformou o STF em palco para Bolsonaro defender mais uma vez o relaxamento das medidas de distanciamento social adotadas contra o coronavírus.
Como ninguém tinha plano a apresentar nem pedido a fazer, ficou claro que a intenção do presidente era apenas constranger Toffoli e transferir responsabilidades, em vez de buscar a cooperação.
Em decisão unânime, o Supremo já esclareceu que estados e municípios têm autonomia para tomar providências para lidar com a pandemia. Tratando-se de Bolsonaro, a inação federal é o menor dos males.