Postado às 05h18 | 23 Nov 2021
EL País
Terceiro partido que mais apoiou as pautas bolsonaristas nos quase três anos de Governo, o PSDB está em vias de sofrer uma debandada de seus parlamentares. A revoada tucana deve ocorrer em abril, quando se abre a janela partidária. Até 13 dos 33 deputados federais do partido podem deixar a legenda, que se desgastou neste fim de semana ao adiar a definição de seu candidato à presidência da República. Ao menos oito já teriam sinalizado a intenção a dirigentes estaduais e nacionais. Os outros cinco ainda esperam as movimentações em seus Estados para decidirem se ficam no partido. No Senado, a perda seria menor, apenas um de seis parlamentares. A principal razão para a potencial desfiliação em massa é a sobrevivência política.
Sem poder fazer coligações para as próximas eleições e sem a garantia de um palanque presidencial de peso, os tucanos devem enfrentar dificuldade para se reeleger. Por isso, migrariam, em sua maioria, para partidos do Centrão, como PL, PP e PRB, ancorados na candidatura à reeleição de Jair Bolsonaro, que deve se filiar a uma dessas siglas. Além da garantia de que teriam acesso às emendas parlamentares para contemplarem seus eleitores no ano do pleito. Movimento similar pode ocorrer em outras legendas sem candidaturas fortes para os governos estaduais ou para a presidência.
As informações sobre a possível perda de quadros foram relatadas ao EL PAÍS por cinco parlamentares e representantes da cúpula tucana. “As prévias nos deixaram fissuras que não serão sanadas”, relatou um dos congressistas que já contabiliza as baixas. Eles também ressaltam que, por outro lado, o partido deve se fortalecer onde apresentar candidaturas fortes ao Governo do Estado, como São Paulo, Rio Grande do Sul, Maranhão, Alagoas e Mato Grosso do Sul. Em Minas Gerais, Estado que já governou por três mandatos seguidos —de 2003 a 2015— o PSDB já calcula dificuldade eleitoral. “Em Minas, há uma rejeição alta ao PSDB e ao PT. Sem um nome forte do PSDB nacionalmente, haverá uma aproximação automática ao Bolsonaro, para que alguns possam se eleger para a Câmara”, disse uma fonte tucana.
A estratégia desses peessedebistas é vender que a adesão ao bolsonarismo é pragmática, não ideológica. Seria o apoio em troca de emendas parlamentares ou palanques fortes. “Há alguns no partido que são viciados em máquina pública. Eles dependem não só do Bolsonaro ou do presidente da Câmara, mas de quem estiver no poder”, ressaltou outro tucano.
A deputada Mara Rocha (AC) admitiu no domingo, durante as tumultuadas prévias presidenciais do PSDB, entre os governadores João Doria e Eduardo Leite, que migrará para o PL juntamente com Bolsonaro —o senador Roberto Rocha (MA) deve seguir o mesmo rumo. Mara alegou que estava sendo impedida de votar e que lhe ofereceram dinheiro por apoio, mas que não se vendeu e que, mesmo estando de saída da legenda por ser bolsonarista, iria votar em Leite, governador do Rio Grande do Sul. “Se não me deixarem votar, vou dizer quem quis comprar o meu voto. Eu tenho mensagem, tenho áudio”, disse aos berros durante o caótico processo de votação.
As prévias do PSDB deveriam ter sido concluídas ainda no domingo, mas foram paralisadas por uma falha tecnológica do aplicativo que registrava os votos. Até o momento da paralisação, apenas 3.000 dos 44.700 eleitores tinham votado. O fiasco expôs ainda mais a divisão dentro da legenda. O governador paulista, João Doria, e o ex-prefeito manauara Arthur Virgílio —que participa da disputa como coadjuvante— reclamaram do sistema de votação e articularam para que o pleito fosse adiado para o dia 28. Leite queria que a votação acabasse até terça ou quarta-feira. Após um dia inteiro de reuniões, nesta segunda-feira a direção nacional e os representantes das candidaturas concordaram com a votação no dia 28.
Não bastassem as falhas técnicas, os concorrentes seguiram buscando confusão. Virgílio resolveu atacar Leite, que tem apoio do ex-presidenciável e atual deputado federal Aécio Neves (MG). No domingo, ele reclamou da presença de Aécio no partido: “Considero o PSDB um caminhão carregado de maçãs boas, mas tem uma que está estragando as outras. E dou nome e sobrenome: Aécio Neves”. Quando se tornou governador de São Paulo e passou a ostentar maior poder nas instâncias partidárias, Doria tentou expulsar Aécio da legenda, mas não conseguiu. Por isso, de pronto, ele apoiou uma candidatura com potencial de derrotar o governador paulista na disputa interna.
Nesta segunda, o deputado mineiro rebateu os ataques, disse que seu colega se transformou numa figura pouco relevante no PSDB e que age como uma linha auxiliar de Doria. Disse ainda que teria uma conversa no pomar com Virgílio. “Quando encontrá-lo vamos ter uma conversa no pomar. Da maçã do PSDB com o laranja do Doria”, afirmou em nota.
Outra acusação que Neves tentou rebater —e que tem sido feita não só por Virgílio, mas por boa parte dos analistas políticos— é a de que ele tem usado a sua liderança entre os tucanos para entregar cada vez mais votos a Bolsonaro e para se aproximar do Centrão, o fisiológico grupo de centro direita que sustenta o presidente no poder. “Essa história de querer levar o PSDB para o Centrão é mais uma falsa narrativa criada para desqualificar o apoio ao Eduardo Leite que muitos tucanos têm dado. O que eu e vários companheiros do PSDB queremos é uma candidatura forte na terceira via, que possa aglutinar outras forças da sociedade.”
Apesar do discurso de Aécio Neves, é notável a aproximação dos tucanos com o Executivo. Das 24 legendas com assento na Câmara, apenas o PSL —pelo qual Bolsonaro e seus apoiadores mais fiéis se elegeram—, com 97% e o DEM, com 93%, deram mais apoio ao Governo do que os tucanos. PSDB, NOVO e MDB apoiaram 91% dos projetos. Os quatro partidos que têm ministros no Governo e, portanto, são oficialmente da base (PL, Progressistas, Republicanos e PSD), entregaram 90% de seus votos. Aécio deu 95% de seus votos para as pautas do Governo. Entre os tucanos estão em sua frente apenas Alexandre Frota (SP) e Otávio Leite (RJ), ambos com 97%, além de Domingos Sávio (MG), com 96%.
Independentemente de quem saia vencedor das prévias, os tucanos ainda terão de botar a candidatura presidencial de pé. Ao se apresentarem como contraponto a Bolsonaro e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Lula, eles dependem de como progredirá a candidatura do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro (Podemos), concorrente na terceira via, que eles podem acabar tendo de apoiar, numa mesma chapa. É a franca decadência de um partido que governou o país por oito anos, chegou a ter 99 dos 513 deputados e, em seis das últimas sete eleições presidenciais, protagonizou a disputa com o PT.