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Considerada 'boa de briga', nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala é primeira mulher diretora-geral da OMC

Postado às 05h36 | 16 Fev 2021

Considerada "boa de briga" pela disposição de enfrentar grandes desafios, a economista nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala foi nomeada nesta segunda-feira como diretora-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Ela se tornará a primeira mulher a liderar a organização. Seu mandato começa no dia 1º de março.

Desde que foi criada, em 1995, a OMC só foi chefiada por homens. O último diretor-geral foi o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo, que deixou o cargo em agosto do ano passado, um ano antes do planejado.

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A escolha de Ngozi Okonjo-Iweala ocorreu em uma reunião especial do Conselho Geral após um processo de seleção que incluiu oito candidatos de todo o mundo.

Em seu discurso, Okonjo-Iweala disse que uma das suas principais prioridades é trabalhar com os membros para abordar as consequências na saúde e na economia causadas pela pandemia de Covid-19.

"Uma OMC forte é vital se quisermos nos recuperar completa e rapidamente da devastação causada pela pandemia. Estou ansiosa para trabalhar com os membros para moldar e implementar as respostas políticas de que precisamos para fazer a economia global funcionar novamente", disse a nova chefe da organização.

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"A organização enfrenta muitos desafios, mas trabalhando juntos podemos tornar a OMC mais forte, mais ágil e mais bem adaptada às realidades de hoje", acrescentou.

O presidente do Conselho Geral David Walker, da Nova Zelândia, que liderou o processo de seleção junto com os co-facilitadores Dacio Castillo, de Honduras, e Harald Aspelund, da Islândia, parabenizou Okonjo-Iweala e prestou agradecimentos em nome de todos os membros da organização.

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O delegado dos EUA na entidade, David Bisbee, disse estar "ansioso" para trabalhar com a diretora-geral. "Os Estados Unidos estão empenhados em trabalhar em estreita colaboração com Okonjo-Iweala e ela pode contar com os Estados Unidos como um parceiro construtivo", disse Bisbee à Reuters.

Escolhida com apoio de Biden

Okonjo-Iweala havia recebido o apoio de vários países da OMC, incluindo a China, União Europeia, Japão e Austrália.

Durante o governo de Donald Trump, porém, o ex-presidente preferia a outra concorrente com chances de ser escolhida, a ministra do Comércio da Coreia do Sul, Yoo Myung-hee.

Isso travou o processo de escolha da nova liderança da organização, já que a nomeação deve ser unânime entre todos os membros da OMC.

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Com a chegada de Joe Biden à presidência dos EUA, o bloqueio imposto por Trump foi desfeito. Para a Casa Branca, Okonjo-Iweala tem todos os requisitos para colocar o comércio global de volta nos trilhos e fechar os abismos cada vez maiores — seja entre a China e os Estados Unidos ou nações ricas e pobres — em um momento em que as regras econômicas básicas estão em jogo.

Afinal, quem é a nova chefe da OMC?

Okonjo-Iweala tem 66 anos e é economista especializada em finanças globais. Iniciou sua carreira no Banco Mundial em 1982, onde foi diretora de operações e trabalhou por 25 anos.

Também foi duas vezes Ministra das Finanças, sendo a primeira mulher a comandar o cargo, e chefe diplomática da Nigéria.

Com a pandemia, Okonjo-Iweala presidiu a Aliança Global para Imunização e Vacinação e liderou um dos programas da Organização Mundial da Saúde de luta contra a Covid-19.

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Conhecida por ter enfrentado sequestradores dentro de casa, combatido a corrupção e ocupado os cargos mais altos do Banco Mundial, a ex-aluna de Harvard é chamada de "encrenqueira" por amigos e inimigos de seu país de origem.

A "encrenqueira" é conhecida assim em razão de seu vigor em defender os pobres e lutar pelo bom combate, e considera o apelido uma medalha de honra.

"Se eu for considerada um problema para o sistema por causa do meu desejo de limpar nossas finanças públicas e trabalhar por uma vida melhor para os nigerianos, então que assim seja", escreveu em seu livro "Reformando o irreformável".

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Okonjo-Iweala é filha de um rei da Nigéria, mas foi com sua mãe que viveu um dos acontecimentos mais marcantes de sua vida: viu a progenitora ser sequestrada — ela ousou denunciar a corrupção na indústria do petróleo nigeriana — e então encarou seus captores.

Detalhes do episódio, porém, nunca foram revelados. E a própria Okonjo-Iweala também já recebeu telefonemas ameaçadores de adversários políticos.

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Da infância difícil a Harvard

Nascida na cidade de Ogwashi-Ukwu, no sul da Nigéria, Okonjo-Iweala passou a maior parte de sua infância difícil com a avó, enquanto seus pais estudavam nos Estados Unidos.

Ela saiu de casa ainda adolescente, em 1973, para estudar economia em Harvard e, em 1981, obteve seu doutorado em Economia Regional e Desenvolvimento pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts, tornando-se cidadã dos Estados Unidos em 2019.

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Em 2007, ela fundou a NOI Polls, o primeiro grupo de pesquisa de opinião indígena da Nigéria, que tem parceria com a Gallup. Seguindo seus passos em Harvard, sua filha e três filhos se formaram na escola da Ivy League. Seu marido é um neurocirurgião que mora em Washington.

Grande período do currículo de Okonjo-Iweala foi passado no Banco Mundial, sendo a número 2 da instituição.

Na Nigéria, foi ainda a primeira mulher Ministra das Finanças do país, sob o comando do ex-presidente Olusegun Obasanjo.

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"Naquela época, parecia que tínhamos que consertar tudo de uma vez", escreveu Okonjo-Iweala em seu livro sobre seu período como chefe de finanças de Obasanjo, de 2003-2006.

“Precisávamos corrigir a desigualdade fundamental, a corrupção generalizada e as lutas pelo poder que estavam minando a sociedade nigeriana”.

À frente da OMC, sua figura promete revigorar os 164 membros e tirar a organização da crise mais profunda em seus 25 anos de história.

Há anos, a OMC não fecha um grande acordo comercial multilateral. O prazo de 2020 para o fim dos subsídios à pesca predatória também não foi cumprido.

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Okonjo-Iweala também pretende que desempenhar um papel na ajuda aos países mais pobres para obtenção de vacinas contra a Covid-19.

"O comércio pode contribuir para a saúde pública, percebendo essa conexão, invocando as regras da OMC, discutindo ativamente as questões da Covid-19 e como a OMC pode ajudar... Para mim, isso seria uma prioridade", disse ela à Reuters em setembro.

 

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