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Como Regina Duarte entra em rota de colisão com o governo

Postado às 04h45 | 10 Mar 2020

Nexo

Em seis dias como secretária especial da Cultura, Regina Duarte já coleciona desavenças com integrantes do governo e apoiadores de Jair Bolsonaro. A lista de desafetos inclui um dos filhos do presidente, Carlos Bolsonaro, vereador do Rio, responsável por quedas de ministro desde que o pai assumiu o comando do país.

No governo Bolsonaro, a pasta da Cultura vem enfrentando diversas turbulências. Roberto Alvim, antecessor de Regina, foi demitido após ter feito um vídeo em que parafraseava um discurso do ministro de propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels.

A secretaria especial, além disso, está hoje submetida ao ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), denunciado à Justiça pelo Ministério Público Eleitoral. Ele é acusado de articular esquema de candidaturas laranjas para acessar recursos do fundo eleitoral na campanha de 2018 do PSL.

O Nexo lista abaixo os atritos já vividos por Regina Duarte desde que aceitou integrar o governo Bolsonaro.

O ataque dos olavistas

Ainda antes da posse oficial, Regina Duarte foi responsável pela demissão de seis pessoas da Secretaria Especial que faziam parte da “ala olavista”, grupo do governo ligado ao escritor Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo. Eles ocupavam postos como a presidência da Funarte (Fundação Nacional de Artes) e a secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura.

Na manhã em que as demissões foram publicadas no Diário Oficial, a hashtag #Foraregina ficou em alta no Twitter. Olavo de Carvalho, que costuma influir nas escolhas do presidente Bolsonaro para a equipe de governo, também disse que ter apoiado a escolha de Regina Duarte para o cargo foi um erro.

No início de fevereiro, ela já tinha conseguido também a demissão da reverenda Jane Silva do cargo de secretária interina. A reverenda havia sido indicada pela própria atriz, que então negociava seu rompimento de contrato com a TV Globo. No cargo, porém, Jane estava tomando decisões sem consultar Regina Duarte, segundo informação de bastidores publicadas pelo jornal Folha de S.Paulo.

Regina Duarte também foi criticada pelos olavistas em razão das nomeações que fez. Os nomes indicados seriam “esquerdistas”, uma acusação recorrente na guerra cultural travada pelos apoiadores de Bolsonaro.

Carta branca, mas nem tanto

Em seu discurso de posse, Regina Duarte cobrou do presidente Bolsonaro poder ter autonomia no cargo. Disse que não esqueceria de que o convite que havia recebido para a secretaria “falava em porteira fechada, carta fechada”, isto é, em liberdade para escolha e manutenção da equipe que iria dirigir.

Minutos depois, contudo, Bolsonaro advertiu a secretária sobre ter a última palavra nas escolhas para a pasta. "Todos os meus ministros também receberam seu ministério de porteira fechada. Por isso, tem liberdade de escolher seu time. Obviamente, em alguns momentos, eu exerço o poder de veto de alguns nomes. Eu já fiz em todos os ministérios. Até porque, para proteger a autoridade", disse o presidente.

Na segunda-feira (9), o ministro-chefe da Casa Civil, general Braga Netto, anulou a nomeação de Maria do Carmo Brant de Carvalho, escolhida pela nova secretária especial para comandar a pasta da Diversidade. Carvalho vinha sendo atacada nas redes bolsonaristas por ter sido secretária de Assistência Social em governos anteriores.

O presidente da Fundação Palmares

Regina Duarte, por enquanto, preservou Sérgio Camargo, indicado pelo então secretário Alvim, no cargo de presidente da Fundação Palmares, destinada ao desenvolvimento da cultura afro-brasileira.

O bolsonarista tem ampla rejeição dos movimentos negros. Entre os motivos do desgosto, estão a negação de que exista racismo no Brasil e a declaração de que a escravidão “teria sido benéfica para os descendentes” das pessoas escravizadas.

Na entrevista que deu no domingo (8) para o Fantástico, da TV Globo, Regina foi questionada sobre a manutenção de Sérgio Camargo na presidência da fundação e respondeu: “voltamos aí a essa situação da política, que interfere no fazer cultural, na medida que temos uma pessoa que é um ativista, mais que um gestor público. Estou adiando esse problema porque essa é uma situação muito aquecida”.

Nesta segunda-feira (9), Camargo rebateu a declaração de Regina com uma indireta: “Bom dia a todos, exceto a quem chama apoiadores do Bolsonaro de facção e o negro que não se submete aos seus amigos da esquerda de "problema que vai resolver", escreveu no Twitter.

Antes disso, Sérgio Camargo já tinha afirmado que ela havia pedido sua demissão, mas que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, negaram o pedido. "Regina quer abrir diálogo com o movimento negro. Digo que é ingenuidade, para ser gentil", disse o presidente da Fundação Palmares.

Os tuítes do general

Em seu sexto dia à frente da Secretaria Especial de Cultura, Regina sofreu uma dura crítica no Twitter do ministro-chefe da Secretaria de Governo, o general Luiz Eduardo Ramos, nesta segunda-feira (9).

Segundo a própria Regina, Ramos foi uma das pessoas que mais a incentivaram a assumir o cargo. O general, no entanto, ficou insatisfeito com as declarações dadas pela atriz ao programa Fantástico. Durante a entrevista realizada, ela afirmou ter sofrido com “intrigas e fake news de toda uma facção que quer ocupar esse lugar”.

Depois de dizer que a “Cultura deve se espelhar na família tradicional e nos princípios cristãos”, Luiz Eduardo Ramos afirmou: “ministros e secretários que devem se moldar aos princípios publicamente defendidos pelo Presidente da República, não o contrário”.

Sobre Regina ter usado o termo “facção” para se referir a grupos da gestão Bolsonaro, o comandante da Secretaria de Governo negou que existam divisões na Esplanada e disse que todos os ministros e secretários devem seguir a “orientação político-ideológica” do presidente.

A oposição de Carlos Bolsonaro

Segundo coluna de Lauro Jardim, de O Globo, o filho do presidente e vereador carioca, Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), está incomodado com a entrevista de Regina Duarte. Ele teria dito a interlocutores, na manhã desta segunda-feira (9), que terá como missão derrubar Regina do governo. Carlos já esteve envolvido na demissão de pelo menos dois ministros do governo de seu pai.

Em fevereiro de 2019, o vereador disse que Gustavo Bebianno, então ministro da Secretaria-Geral da Presidência, estava mentindo ao afirmar que mantinha relações normais com o presidente. O ministro estava sendo citado em suspeitas de desvio de recursos envolvendo o uso de candidatos laranjas pelo PSL durante as eleições. Menos de uma semana depois, Bebianno foi demitido.

Em junho de 2019, foi a vez do general Carlos Alberto dos Santos Cruz, que comandava a Secretaria de Governo. Responsável pela área de comunicação governamental, Santos Cruz era uma dos maiores alvos de olavistas, incluindo Carlos Bolsonaro. O vereador é um dos principais responsáveis pelas contas pessoais de seu pai nas redes sociais e discordava frequentemente do militar.

 

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