Postado às 07h01 | 07 Jun 2020
Folha
Carlos Bolsonaro tinha apenas 17 anos quando seu pai, Jair Bolsonaro, o incumbiu de uma árdua tarefa: derrotar a mãe, a então vereadora Rogéria Bolsonaro, nas eleições para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Soldado leal, Carlos cumpriu a missão. Candidato oficial de Jair nas eleições de 2000, ele conquistou 16 mil votos, tirou votos de Rogéria e frustrou a tentativa de reeleição da mãe, que obteve apenas 5.000.
Passados 20 anos, o filho do presidente terá a oportunidade de redenção na eleição municipal deste ano, quando poderá usar sua influência para eleger Rogéria vereadora. Apesar dos apelos do pai, Carlos ainda não decidiu se ele próprio buscará a reeleição novamente.
Primeira mulher de Bolsonaro, Rogéria foi eleita vereadora em 1992, abençoada pelo marido, então deputado federal. Jair enxergava o mandato como uma extensão de seus poderes –ela deveria consultá-lo sobre matérias polêmicas e seguir suas orientações.
A mãe dos três filhos políticos de Bolsonaro (Flávio, Carlos e Eduardo) se reelegeu em 1996. Logo em seguida, veio a separação do casal. Alegando que a ex-mulher já não respeitava mais suas decisões, ele a acusou de infidelidade e sabotou sua campanha em 2000.
Bolsonaro primeiro foi à Justiça na tentativa de impedir que Rogéria usasse seu sobrenome na campanha. Sem sucesso, decidiu derrotá-la nas urnas.
Como precisava encontrar alguém que pudesse fazer frente a Rogéria, que carregava o nome da família, o então deputado fez uma enquete entre seus aliados, e o escolhido foi Carlos.
A disputa foi tensa. À época, Rogéria chegou a acusar Bolsonaro de ter ordenado o espancamento do assessor Gilberto Gonçalves, preso enquanto distribuía panfletos em favor de sua candidatura.
"Isso prova o desequilíbrio mental e psicológico do deputado, que chegou a colocar o filho de 17 anos de idade a concorrer contra a própria mãe", disse Rogéria na ocasião, segundo reportagem do jornal Tribuna da Imprensa, publicada em setembro de 2000.
Com 17 anos, Carlos precisou ser emancipado para concorrer naquela eleição. Como faz aniversário em dezembro, ele pôde assumir o cargo porque já era maior de idade quando tomou posse, no início de 2001.
"Jair o lançou, mas nem acreditava que iria elegê-lo", contou à Folha o chefe de gabinete de Carlos na Câmara Municipal, Jorge Fernandes.
A entrevista aconteceu em abril do ano passado, em meio à apuração sobre o uso de funcionários fantasmas no gabinete do filho do presidente.
Na ocasião, Jorge Fernandes afirmou que ele próprio deu a notícia da vitória de Carlos a Jair Bolsonaro. O jovem havia superado nomes como o do cantor Agnaldo Timóteo. "Liguei pro Jair, ele não acreditou, falou: 'Como assim tá eleito?' [Respondi]: 'Tá eleito, foi o terceiro, entrou na sobra'", disse.
Segundo o chefe de gabinete, Carlos aceitou tranquilamente a missão de derrotar a mãe. "Carlos morre pelo pai. Ele gosta muito da Rogéria, ajuda em tudo. Mas é Deus no céu e o pai dele na terra."
A adoração fica evidente na defesa que o vereador faz de Jair Bolsonaro, seja nas redes sociais ou no Planalto, ao criar desentendimentos com aliados que acusa de traição.
Sua lealdade também ficou explícita em dois momentos cruciais da vida do pai.
O "pitbull" da família não arredou pé do hospital onde o presidente esteve internado após ser vítima de um atentado a facada, em meio à campanha de 2018. Já na cerimônia de posse presidencial, Carlos foi o único filho a aparecer atrás do pai durante desfile em carro aberto.
Ao mesmo tempo, segundo interlocutores, Carlos sente ciúmes das mulheres com quem o pai se casou após se separar de sua mãe. Além de escolher o próprio filho para derrotar Rogéria, Jair entregou a chefia do gabinete de Carlos para Ana Cristina Valle, sua mulher à época.
Neste ano, ele terá mais uma importante chance de defender a mãe. No fim de março, ambos se filiaram ao Republicanos, partido do prefeito Marcelo Crivella, visando as eleições municipais.
Vereador mais votado no Rio, Carlos ainda não decidiu se será candidato outra vez. Desde 2018 ele se mostra insatisfeito com o trabalho no legislativo carioca, do qual se licenciou por quatro vezes durante a campanha do pai. A interlocutores, chegou a dizer que pensava em se mudar para Santa Catarina, para onde viaja com frequência.
Caso abra mão da própria candidatura, o filho do presidente poderá concentrar os esforços na campanha da mãe e devolver-lhe a cadeira da qual a destituiu há 20 anos