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Bolsa de valores: Um dia para ser esquecido, mas é no caos que surgem as boas apostas

Postado às 03h58 | 11 Mar 2020

Se existem dias para serem esquecidos nos mercados, ontem, sem dúvida alguma, foi um dia desses. O caos começou a se desenhar ainda no domingo à noite, quando os contratos de petróleo no pregão eletrônico eram negociados com queda de 30%. Isso graças a um embate entre Arábia Saudita e Rússia, o que fez o primeiro país derrubar os preços e aumentar a produção da commodity. Se o cenário já estava nervoso com a proliferação do coronavírus, formou-se a tempestade perfeita para os ativos começarem a semana em queda livre e isso não é força de expressão.

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Antes de a bolsa brasileira abrir, os recibos das ações das companhias locais negociados nos Estados Unidos (os chamados American Depositary Receipts, ADRs) já caíam pelo menos 10%. Nas redes sociais, já se falava no provável acionamento do "circuit breaker" — quando as negociações na B3 são suspensas, inicialmente por meia hora, se o Índice Bovespa atingir queda de 10%.

Batata! Às 10 horas, a bolsa abriu com o Ibovespa caindo de cara 8% e, meia hora depois, ele já caía 10% e os negócios foram paralisados. Foi a primeira vez que o "circuit breaker" foi acionado desde 18 de maio de 2017, data que ficou conhecida como "Joesley Day" — dia seguinte ao do vazamento da conversa do acionista da JBS com o então presidente da República, Michel Temer.

Essa meia hora na manhã de ontem serviu para os investidores tomarem uma água, acalmarem os ânimos e retomarem o fôlego para sobreviver ao resto do pregão, que ainda prometia fortes emoções. Mas não foi suficiente para mudar a tendência. A bolsa reabriu e a sanha vendedora continuou firme e forte. Resultado: o Ibovespa fechou em queda de 12,17%, aos 86.067 pontos. Tanto o percentual quanto a pontuação merecem destaque, negativo, claro.

Essa é a maior queda percentual do índice desde setembro de 1998, quando a Rússia decretou a moratória da sua dívida externa, deflagrando o que foi chamada de "Crise da Rússia". Nem Lava-Jato, nem impeachment da presidente Dilma Rousseff, nem atentado às Torres Gêmeas nos Estados Unidos, nada, nada foi suficiente para tamanha derrocada.

Em pontos, a coisa é menos feia. Esta é a menor pontuação do Ibovespa desde dezembro de 2018. De qualquer forma, os 120 mil pontos, que pareciam ser o próximo alvo do indicador, agora estão longe, longe, dando para ver, quando muito, de binóculo.

Nas ações especificamente houve quedas para todos os gostos, de 5%, 10%, 15%, 20%, 25%, até quase 30%, no caso os papéis da empresa mais importante da bolsa, a Petrobras. Para se ter uma ideia do sangue que jorrou pelo pregão, das 70 empresas que compõem o Ibovespa, 37 delas fecharam com quedas maiores que 10%. Só ontem, os papéis dessas 70 companhias perderam nada menos que R$ 375 bilhões em valor de mercado, conforme levantamento do Valor Investe. Só a Petrobras perdeu R$ 90 bilhões. Isso é o mesmo que dizer que a petrolífera perdeu mais que uma B3, que tem R$ 84 bilhões de valor de mercado, em apenas um pregão.

Desde a quarta-feira de Cinzas, quando os mercados começaram a andar para trás mais intensamente, refletindo o grande aumento no número de contaminados pelo coronavírus, o Ibovespa já perdeu R$ 864 bilhões de valor de mercado, quase a mesma coisa que a soma das quatros empresas mais importantes da bolsa brasileira - Petrobras, Vale, Bradesco e Itaú que, juntas, tinham ontem R$ 879 bilhões de valor de mercado.

Se a bolsa embicou para baixo, o comportamento do dólar foi tão intenso quanto, só que para cima. A cotação da moeda americana chegou a ser negociada a R$ 4,79, mas fechou em R$ 4,7282 (novo recorde nominal), em alta de 2,03%, depois de o Banco Central injetar US$ 3,46 bilhões no mercado.

Nem a renda fixa passou ilesa por esse dia de "barata voa" no mercado. Ainda na parte da manhã, as negociações dos títulos públicos no site do Tesouro Direto foram suspensas, já que os preços dos papéis oscilaram significativamente. A rentabilidade paga pelos títulos aumentou para os novos compradores, mas prejudicou quem tinha títulos prefixados e atrelados a inflação na carteira.

E agora, José?

Depois de ler um texto inteiro só de tragédias, você deve estar se perguntando: então, o que eu faço? E deve estar achando que a resposta seja: venda todas as suas ações, pelo preço que conseguir, e fique o mais longe da bolsa possível. Certo? Errado.

Para os analistas ouvidos pela repórter Nathália Larghi, depois desse movimento acentuado de queda, existem boas chances de o mercado voltar a subir, muito mais do que voltar a cair nessa intensidade. Então isso significa que acabaram as quedas? Errado. Não dá para dizer que novos pregões de baixa não vão acontecer, até porque ainda não está claro o que pode ocorrer no mercado de petróleo. No entanto, mesmo com o aumento dos casos de coronavírus no mundo e a possibilidade cada vez maior disso impactar o crescimento econômico global, o cenário ainda não justifica uma mudança de tendência dos ativos (especialmente as ações), que até agora era de valorização.

Como disse o analista da Mirae Asset Management, Pedro Galdi: "Não temos certeza sobre o tempo de duração do coronavírus, mas nossa bolsa caiu ainda mais do que outras. Estamos chegando ao fundo do poço. É difícil dar certeza que acabaram [as quedas], mas sair de 130 mil pontos para 88 mil é uma baixa forte. Então, é possível que a bolsa suba de novo. Acredito que seja um bom ponto de compra."

Mesmo que você não compre novas ações, porque está receoso com essa chacoalhada do mercado, no mínimo não faz sentido sair vendendo os papéis na bacia da almas se não estiver precisando do dinheiro, principalmente se você entrou na bolsa nos últimos meses, quando o Ibovespa já flertava a marca dos 100 mil pontos ou até acima disso. Para quem quer se aprofundar no tema, o analista de ações e blogueiro André Rocha traz no nosso cinco dicas para tentar ganhar (ou no mínimo não perder) dinheiro nessa crise.

Para quem investe no Tesouro Direto, a Naiara Bertão procurou analistas para responder se, após a subida de ontem das taxas, chegou a hora de retomar as compras de papéis prefixados e atrelados a inflação. O título prefixado com vencimento em 2031, por exemplo, está pagando agora 7,31%, ante 6,95% na sexta-feira.

Em resumo, a grande recomendação agora é não sair no desespero, se desfazendo dos seus ativos como se não houvesse amanhã. Para quem não tem muito apetite por risco, e não quer colocar nem mais um tostão na bolsa por enquanto, o conselho é pelo menos esperar os próximos dias, para ver se há uma definição melhor do cenário. Não sem antes abastecer o estoque de chá de camomila, já que o mercado ainda pode consumir um pouco mais dos nervos dos investidores. (Valor)

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