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Análise: "O que o mercado não quer ouvir"

Postado às 06h39 | 28 Nov 2022

Ney Lopes

Além do futebol, a semana começa com muita expectativa política.

O ponto número um da agenda de transição, agora com a presença de Lula, será a definição do novo ministro da Fazenda.

Não sei quem será o indicado.

Porém, discordo daqueles que afirmam ter Fernando Haddad se saído mal do encontro com os banqueiros na última semana.

No almoço da Febraban, ao qual afirmou claramente que ia representando o próprio Lula, Haddad disse que o governo dará prioridade à reforma tributária e pregou o uso mais eficiente dos recursos públicos.

Ora, se falou em nome de Lula, não poderia além de enfatizar o binômio responsabilidade fiscal e responsabilidade social.

O problema o discurso de Haddad não é com o que ele disse, mas sim com o que ele não disse, porque não tinha autorização para dizer.

Quem acompanha os fatos no país sabe os temores do “mercado”, no caso representado pelos banqueiros no almoço.

O “mercado” ou a “Faria Lima” como é chamado assimila responsabilidade social como sendo a continuidade das políticas atuais.

Jamais admitem mudanças mais profundas no sistema tributário para financiar com maior extensão essas políticas sociais.

E aí está o “gargalo” do discurso de Haddad: ele afirmou que a reforma tributária será feita inicialmente sobre o consumo, mas em seguida ao governo encaminhará proposta de reformas sobre a renda e o patrimônio.

O circo pegou fogo a partir desse anuncio.

Quando o mercado fala em reforma tributária, a intenção é simplificar o caótico sistema de cobrança, unificando impostos que incidem sobre consumo, mas sem mexer na proporção de carga tributária em relação ao Produto Interno Bruto.

O objetivo é reduzir imposto. 

Não é possível, por exemplo, que jatinhos, helicópteros, lanchas e iates de luxo não sejam tributados pelo IPVA, enquanto os carros populares, sim.

O “mercado” assimila mudanças tributárias apenas no consumo, onde a tributação é feita por cinco tributos diferentes, cada um com sua legislação própria e diversos regimes; o ICMS possui vinte e sete legislações diferentes e o ISS tem uma legislação para cada município que o instituiu; em cada ente, e em cada tributo, as legislações apresentam uma série de exceções às regras gerais.

O “mercado” não assimila mudanças que atinjam renda, patrimônio, herança, lucros e dividendos.

Esse é o “nó” da questão!

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Enquanto isso, a tributação sobre renda e patrimônio como proporção da carga tributária no Brasil é de 22%, contra 40% em países desenvolvidos.

Já a tributação indireta (consumo) brasileira chega a quase 50%, enquanto, na OCDE, fica em 33%, na média.

Essa tributação indireta tende a pesar mais sobre os mais pobres, pois eles gastam a maior parte da sua renda em consumo.

O que parece é que, Haddad mesmo sendo graduado em economia, tenha mestrado, seja professor e com a experiência de ter governado São Paulo, não falou o que o mercado quer ouvir.

Seja quem for o interlocutor de Lula para o “mercado”, ou até ele próprio, ou muda essa linguagem de tributar renda, patrimônio, herança, lucros e dividendos (o mundo capitalista tributa), ou a consequência será a eterna “chantagem” do dólar subir e as ações caírem no outro dia.

Justiça se faça: Bolsonaro tentou enfrentar esse dilema e encontrou resistencias.

Pergunto a mim mesmo, o que o “mercado” brasileiro acha do documento recentemente divulgado por bilionários globais.

No documento, ricos da América do Norte, da Europa e da Oceania pedem para serem mais tributados, em uma tentativa de diminuir a desigualdade e para que os governos possam arcar com os gastos decorrentes da pandemia.

Será uma nova corrente de comunistas globais?

 

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