Postado às 05h21 | 23 Set 2020
O presidente Jair Bolsonaro vem sendo criticado pela fina flor do “laissez faire”, por ter lembrado o “cartão vermelho” para a proposta da equipe econômica, que sugeriu desvincular o salário mínimo dos proventos/pensões de inativos e congelar por dois anos.
Mais uma vez, “quem pagaria o pato” seriam os necessitados e a classe média, como aconteceu, em parte, na reforma da previdência. Houve ainda o desplante de afirmar inexistência de redução e sim manutenção do valor do benefício. Raciocínio cruel.
Diante disso, o Presidente declarou: “jamais vou tirar dinheiro dos pobres para dar aos paupérrimos”.
Essa afirmação merece análise, a partir da premissa de Pitágoras: “pensem o que quiserem de ti; faz aquilo que te parece justo”.
Parece-me justo redimir o Presidente da acusação de estar usando linguagem demagógica, eleitoreira, corporativista, gastador e irresponsável com as contas públicas. No seu polêmico perfil, sempre falou o que pensa. Sou testemunha, por ter convivido com ele mais de 15 anos na Câmara Federal.
O Bolsonaro que conheci sempre foi defensor de justiça para a carreira militar, servidores públicos, inativos, categorias sociais, que são sinônimos de classe média.
Em Congresso, no qual tantos defendiam (e defendem) sindicatos (CUT), Igrejas, setores da economia, por que seria mácula defender a classe média e assalariados em geral?
Acusa-se ainda o Presidente, de falsidade na demonstrada sensibilidade social, cujo objetivo seria a sua reeleição.
A propósito, em 1965 era deputado federal e tive a honra de ter como colega o então deputado Tancredo Neves. Em “roda de papo” na Câmara, ouvi o velho mineiro responder pergunta do jornalista Teixeirinha (já falecido) sobre a principal virtude do político.
Disse Tancredo: “é o instinto da sobrevivência”.
O Presidente Bolsonaro exercita o seu legítimo direito de preservar a sua sobrevivência política, que não se confunde com prática de ilícitos. Sabe-se que ele aderiu a uma agenda econômica ultraliberal, que lhe foi trazida, por acaso, pelo “tzar” Paulo Guedes, cujo preparo técnico é inegável, porém falta-lhe sensibilidade social para ser o “salvador da Pátria”.
Talvez por isso, há anos tentasse influir na economia brasileira e não conseguira em governos anteriores. Nada impede que Bolsonaro agora corrija rumos da “agenda” e dê prioridade ao social, como o mundo vem fazendo na pandemia.
A bussola que guia o “tzar” Guedes, ainda é a Escola de Chicago, do seu “guru” nos anos 70, Milton Friedman. Hoje, essa teoria está ultrapassada, no seu próprio berço.
Quem diz isto é o economista James Heckman, professor em Chicago, laureado com o prêmio Nobel em 2000.
No início do governo, Guedes deixou claro o que desejava para o Brasil, ao declarar à Folha, que “os ricos capitalizam” enquanto “os pobres consomem tudo”.
Como poderia poupar quem vive com R$ 413 por mês e cerca de 14 milhões, com até R$ 8 por dia?
Por desatenções desse tipo, ele está condenado pela justiça, por ter agredido os funcionários públicos, chamando-os de “parasitas” e “assaltantes” do Brasil.
Comenta-se ter sido o conterrâneo Rogério Marinho quem “abriu os olhos” do Presidente, mostrando-lhe a transformação da economia, com a ênfase dada ao social, na fase pós pandemia.
Ao contrário do que pensa o “tzar”, Rogério alertou que o governo precisa mostrar resultados, socorrer os vulneráveis, sem prejuízo de equilíbrio e sensatez nos gastos públicos. Isto é possível fazer.
Afinal, o empobrecimento começou antes do covid-19 e não há tempo a perder na reversão desse processo. Pela sua visão social, Rogério caiu na desgraça do “tzar”, mas Bolsonaro e a área militar assimilaram bem.
A tese do potiguar ministro encontra precedente na “Grande Depressão” americana, quando o presidente Roosevelt aumentou o investimento público, sem intervencionismo, reativou o consumo e reaqueceu a economia.
Teria sido Roosevelt gastador e corporativista?
Ou, ele aplicou a regra de que nas “crises” quem dá assistência é o Estado e “todos” têm que “dividir sacrifícios”?
Cabe lembrar, que Roosevelt reelegeu-se Presidente em 1936, justamente pelas medidas que tomou no período da crise econômica.
No Brasil, investidores lúcidos rejeitam “o liberou geral”, porque também precisam de um Estado forte e com estabilidade política, para garantia da liberdade de mercado.
A OCDE anuncia recuperação na economia brasileira, com a perda no PIB passando para 6.5%, menor do que 2019.
Essa luz no final do túnel já justifica a confiança em melhores dias. Para que isso aconteça, de forma justa e sustentável, é conveniente que o Presidente tenha sempre em mãos o “cartão vermelho” para usá-lo, se necessário.