Postado às 06h29 | 26 Jul 2023
Em protesto pelo arbítrio do governo alguns jornais de Israel tiveram, a primeira página em preto (luto).
Ney Lopes
A atual situação política de Israel é crítica.
Há riscos de revolta popular generalizada, diante do propósito do governo do primeiro ministro Netanyahu reformar o Judiciário, com o único objetivo de enfraquecer a independência desse poder.
Há 30 semanas, os protestos tomam as ruas e não há indícios de recuo.
Milhares de manifestantes cantam o “Hatikva”, o hino israelense.
Um verso do hino nacional fala em ser um povo livre, em seu próprio país.
Nesta última segunda, 24, tudo se agravou, transformando-se num dia de trevas para a democracia israelense.
O Parlamento aprovou a controversa reforma judicial, que ameaça o Estado de Direito e abre as portas para um regime ditatorial, comandado por Benjamim Netanyahu, atual primeiro ministro, que se caracteriza como o governo mais à direita e mais conservador da história israelense.
O Estado de Israel completa 75 anos de fundação, com uma história tumultuada.
O país não tem uma Constituição.
As relações entre os cidadãos regulam-se por dois tipos de leis, as normais e as básicas, que muitos entendem como uma Constituição.
Como inexiste uma Carta Magna, não há como tomar decisões judiciais embasando-se na constitucionalidade, mas sim nos chamados "motivos razoáveis".
São justamente esses “motivos razoáveis”, inteiramente subjetivos, que Netanyahu se apoia para reformar o judiciário, que lhe faz sombra.
Os tribunais sempre usaram a “razoabilidade” como uma medida de freio e contrapeso do Judiciário, em relação a ações do governo ou Parlamento, que poderiam ultrapassar os seus limites de atuação.
Com a legislação que o governo israelense acaba de aprovar, a competência do tribunal para aplicar “motivos razoáveis” é totalmente bloqueada.
Em consequência, a justiça, não pode invalidar uma decisão do primeiro-ministro, do governo, de um ministro ou de um funcionário eleito, dando ao governo poder ilimitado.
Verdadeira insanidade!
Na prática, sem a cláusula de razoabilidade, o governo poderá demitir quem quiser, como o procurador do estado, o chefe do estado-maior das Forças de Defesa e, basicamente, qualquer pessoa indicada, por qualquer motivo, sem a necessidade de nenhuma justificativa.
A legislação aprovada permite ainda, que o Parlamento rejeite decisões da Suprema Corte com maioria simples, ou seja, com 61 votos em um total de 120 deputados; realize mudanças no comitê responsável pela nomeação de todos os juízes do país, inclusive os integrantes da Suprema Corte, dando ao governo mais peso na escolha; e acaba com a obrigatoriedade de ministros cumprirem as recomendações dadas por seus assessores jurídicos - orientados pelo Procurador-Geral - atualmente prevista por lei.
Mesmo com as advertências do presidente dos EUA, Joe Biden, para que Netanyahu suspenda imediatamente a reforma legal, até o momento, o primeiro-ministro israelense se mostra irredutível.
Aliados internacionais temem ainda pela imagem da “democracia” no Estado sionista, com impacto nas relações públicas e nos investimentos.
Netanyahu, réu por corrupção e crimes de responsabilidade, é também acusado em âmbito doméstico de governar em causa própria.
Não se sabe qual será o desfecho dessa verdadeira revolução desencadeada, que inverte os valores da democracia...
O mundo assiste perplexo.
Na verdade, passados mais de sete décadas de conflito entre israelenses e palestinos, a única saída possível será a criação na Terra Santa de dois Estados, um israelense e outro palestino.
Mas, até hoje, não passa de um sonho!
Em tempo: As primeiras páginas de vários jornais israelensesl foram cobertas com tinta preta nas edições de hoje, em protesto contra a aprovação da controversa reforma judicial pelo Parlamento.