Postado às 05h47 | 11 Nov 2022
Ney Lopes
A transição de governo traz à tona diariamente temas controvertidos, que ao invés de gerarem inquietação devem ser analisados e discutidos com espírito público, acima de preferências políticas. .
Ontem, 9, em Brasília o presidente eleito Lula fez uma afirmação, que exige reflexão profunda, sem excessos e com realismo.
Ele afirmou: “Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gastos, é preciso fazer superávit, é preciso fazer teto de gastos? ’.
Trocando em miúdos, o presidente mostrou-se favorável a união da prioridade social com o fator econômico, quando forem discutidos tetos de gastos ou temas econômicos.
O FMI em estudo sugere que um período prolongado de altas desigualdades em economias desenvolvidas estaria associado a crises econômicas globais, uma vez que lobistas pressionavam por diminuir a influência dos estados na regulação da economia.
Além disso, a desigualdade econômica também aumenta as tensões sociais e acrescenta ondas de protesto.
Portanto, somente um irresponsável contestaria a necessidade do equilíbrio fiscal e combate a gastança.
Não se trata de defender o presidente Lula, pois não se conhece ainda a sua política econômica no governo.
Entretanto, é prematura essa “onda do mercado” a pretexto de sua declaração, inflada por antecipação, com o único objetivo de evitar mudanças.
Em tese, o futuro do país não pode ficar centralizado, apenas no que interessa ao mercado financeiro.
A economia deve adaptar-se à realidade social e não o contrário.
Dizer que cabe primeiro gerar riquezas e depois distribuir é uma meia verdade.
Claro que, quanto mais bens e serviços disponíveis aos habitantes de um país, melhores serão suas condições de vida e menor será o nível de pobreza.
Mas, essa meta de melhoria da qualidade de vida terá de ser priorizada com a assistência social aos marginalizados, miseráveis, que são filhos de Deus.
A grande lição vem do final do século XIX, com a desintegração da sociedade industrial, quando o papa Leão XIII escreveu a Encíclica “Rerum Novarum”, cuja tradução é “coisas novas”.
A Igreja Católica, até hoje, passou a conectar-se com as questões sociais globais.
Nos idos e sessenta, o RN teve o pioneirismo do então bispo Eugenio Sales, que revolucionou as práticas sociais cristãs, com o chamado Movimento de Natal.
A Campanha da Fraternidade, que permanece viva, nasceu em Nísia Floresta, RN.
O Papa Francisco em mensagem aos jovens economistas e empresários, transferiu para eles a tarefa da economia tornar-se “mais justa, sustentável e solidária, ou seja, mais comum”.
A pandemia trouxe exemplos do mercado e a assistência social andando de mãos dadas.
Países capitalistas como os Estados Unidos, conseguiram o aval do legislativo em pacote social de U$ 1.75 trilhão de dólares para expansão dos benefícios sociais.
Emmanuel Macron, normalmente identificado com a direita, ou com uma espécie de “centro radical”, implanta programas de pagamento direto do subsidio do combustível e reajuste das aposentadorias, para superar os graves problemas decorrentes da pandemia.
O governo da Alemanha pediu pede a suspensão do teto constitucional da dívida alemã e prevê a captação de mais recursos para complementar a resposta social do país à crise provocada pela pandemia.
Até Ângela Merkel, conhecida pela sua austeridade fiscal, apoiou essas medidas emergenciais.
O governo japonês lançou amplo programa de segurança social para proteger a vida das pessoas, fornecendo uma assistência básica para as despesas essenciais.
Este é o exemplo global.
O Brasil, mesmo sem assemelhar-se em riqueza aos países citados, não pode seguir política cujos únicos sacrificados sejam as classes mais baixas e a média.
O Chile tentou fazer assim, deu no que deu.
Colombia e Peru são exemplos de que a ortodoxia econômica não gerou resultados positivos.
Caberá ao Congressos, com coragem e destemor, encontrar os caminhos “responsáveis”, que atendam a emergência nacional, conciliando “gastos às carências sociais”.
Independentemente de ser esquerda, direita, centro, ou defensor de ideologias, o que não pode é a continuidade indefinida das desigualdades sociais no Brasil.
Caso se queira dar nome a esse posicionamento, que se chame "liberalismo social".