Postado às 05h56 | 04 Dez 2023
Protestos de agricultores: "Mercosul a destruição da agricultura francesa".
Ney Lopes
O presidente francês Emmanuel Macron joga “uma pá de cal” no acordo entre União Europeia e Mercosul.
Manifestou –se contra e classificou de “tratado de 'antiquado”.
O ex-ministro da Fazenda Paulo Guedes disse, que a recusa da França é decorrência de um “certo protecionismo oportunista.
"A França tem medo da nossa agricultura. Aí inventam que nós queimamos nossas florestas”.
Paulo Guedes tem razão: os franceses temem o nosso agronegócio e por isto estão “boicotando” o acordo do Mercosul com a União Europeia.
A França é uma potência agrícola, mas em geral manteve modelo de agricultura familiar, com pequenas propriedades, de apenas alguns hectares.
O tamanho médio das fazendas na França é de 100 cabeças, bem diferente das do Brasil, com rebanhos que podem ter mais de 100 mil.
Ou seja, os franceses não têm os mesmos volumes e escalas de produção dos brasileiros, o que dificulta a competição
Além disso, a França é, historicamente, mais protecionista que os outros países europeus e os acordos de livre comércio são impopulares junto ao eleitorado.
O protecionismo agrícola na França se caracteriza pela proteção que o governo estabelece para certos setores da agricultura.
Normalmente é feito através de subsídios, facilidades de crédito ao agricultor e redução de impostos.
Desde 1999, os integrantes do Mercosul e os países da União Europeia negociam um acordo de livre-comércio.
As conversas foram interrompidas em 2004 e retomadas em 2010.
A União Europeia é o segundo parceiro comercial do Mercosul, depois da China, e o primeiro em matéria de investimentos.
Não é a primeira vez que os franceses têm contencioso econômico com o Brasil.
Uma das questões mais relevantes de nossa história recente foi a Guerra da Lagosta, conflito bilateral entre Brasil e França relacionado à pesca da lagosta em águas adjacentes ao Nordeste Brasileiro entre 1961 e 1963.
Embarcações francesas clandestinamente passaram a pescar lagosta em nosos litoral.
Em 1961, pescadores franceses resolveram pescar lagostas na costa brasileira, em Pernambuco, onde encontravam esse crustáceo a tão somente 75 metros.
Os franceses foram denunciados pelos pescadores brasileiros.
Em janeiro de 1962, o lagosteiro francês Cassiopée foi apreendido a dez milhas náuticas da costa do Rio Grande do Norte pela Corveta Ipiranga da Marinha Brasileira.
O Brasil justificou a legalidade da apreensão, alegando que a prática usurpava o patrimônio da plataforma continental nacional.
A França afirmou tratar-se tão somente de atividade de pesca em área externa ao mar territorial.
A situação só foi resolvida em 1965, quando o Brasil e a França assinaram um acordo que estabelecia os limites das águas territoriais brasileiras e permitia a pesca da lagosta por empresas francesas na região de Fernando de Noronha.
No caso específico do pretendido Acordo de Livre Comércio UE e Mercosul, os produtores agrícolas e ecologistas franceses afirmam que o Brasil não cumpre as mesmas exigências sanitárias, trabalhistas e ambientais impostas a produtores da Europa e que, por isso, os produtos têm preços "incomparáveis" aos dos europeus.
Esse é um argumento falacioso.
Em verdade, os franceses levantam tais argumentos para esconderem a verdadeira causa do protesto, que é a manutenção das vantagens de subsidios de 58 bilhões de euros em 2019, mais do que o valor bruto de toda a produção agropecuária brasileira.
Firmado o acordo de livre comércio Europa e Mercosul tais subsídios não seriam permitidos.
Estudos confiáveis demonstram que os agricultores brasileiros têm regras ambientais "muito mais rigorosas", impostas pelo Código Florestal, do que os franceses e europeus.
Está claro que a resistência da França ao Acordo da União Europeia com o Mercosul é pelas pressões políticas internas que Macron vem sofrendo.
De agora por diante, o Mercosul deve ser consolidado e outros acordos poderão ser firmados, como por exemplo, com a Parceria Econômica Global Abrangente (RCEP - Regional Comprehensive Economic Partnership) que é hoje o maior grupo comercial do mundo, agrupando os 10 membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático, além de China, Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia.
Para que isso se torne possível, a América Latina terá que marchar unida, em torno dos seus interesses econômicos básicos.