Postado às 07h37 | 23 Mai 2021
Ney Lopes
O “Estado de São Paulo” publica neste domingo, 23, com destaque, que o senador Osmar Aziz, presidente da CPI da Covid no Senado, quer a reconvocação do ex-ministro Pazuello, sem a concessão do habeas corpus pelo STF.
Para o senador, o habeas corpus dado protege o depoente para mentir, sem correr o risco de ser preso.
Foi mais adiante, o senador Aziz, ao declarar:
“A gente espera poder trabalhar sem a ingerência do Supremo nessa questão. Se o ministro Lewandowski assistiu, vai ver que não pode dar habeas corpus para um cara que mentiu. Pazuello foi lá e defendeu Bolsonaro como se estivesse defendendo o filho dele. Talvez o pai não mentisse tanto pelo filho como Pazuello mentiu por Bolsonaro”.
Não se desconhece a intenção do parlamentar , em buscar bem cumprir as obrigações impostas por uma investigação parlamentar.
As afirmações do presidente da CPI estão protegidas pelo artigo 53, da Constituição, que estabelece: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
Tais circunstâncias não invalidam a garantia constitucional do direito ao silencio, princípio basilar das democracias, que aliás não foi usado pelo ex-ministro no seu depoimento anterior.
Negar essa garantia é negar as liberdades humanas.
Ao reiterar que o depoente é “mentiroso”, a CPI obriga-se, sob as penas da lei, a seguir o rito definido em lei para responsabilizar a testemunha, embora a antecipação da acusação já fira a Constituição, por expor o depoente a degradação pública.
Após considerações sobre o direito ao silencio, cabe indagar se haveria direito de mentir, a pretexto da não incriminação?
Em absoluto.
Inexiste esse direito e a lei mostra os caminhos de coibir tais abusos.
O juiz ou investigador deve identificar a criação de situações falsas, com o objetivo de embaralhar a colheita de prova,
Tal conduta abusiva é descrita no artigo 186 da lei civil, que assim dispõe: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
O artigo 342 do CP tipifica o crime de falso testemunho.
Percebe-se, que não será admitido usar o direito ao silencio para negar contribuição com a justiça.
Todavia, os procedimentos de incriminação terão obrigatoriamente que seguirem a regra do direito brasileiro, sobre o ônus da prova:
“Quem faz alguma acusação tem a responsabilidade de comprovar que a alegação é verdadeira”.
O direito à prova está inserido no quadro das garantias do devido processo legal, princípio constitucional do artigo 5º, inciso LIV da Constituição Federal.
Trata-se da responsabilidade de provar a materialidade e a autoria do delito (ônus probandi), que incumbe a quem fizer a acusação (CPP, artigo 156, caput).
Repita-se: a CPI é instrumento legítimo de investigação.
A sociedade quer conhecer a verdade e responsabilizar culpados, se for o caso.
Todavia, não será demasia lembrar, que o sentimento nacional repele as práticas já usadas no Brasil, no período do AI 5, por exemplo, em que não havia direito de defesa, com as garantias individuais suspensas.
Justamente para evitar que esse período seja ressuscitado, impõe-se a CPI não usar métodos que neguem o devido processo legal, o direito de defesa, ônus da prova, o respeito às decisões do judiciário e a preservação das liberdades públicas.