Postado às 07h17 | 26 Set 2021
Ney Lopes
Realiza-se hoje, 26, a eleição na Alemanha, que indicará o sucessor de Ângela Merkel, a chanceler desde 2005 e líder do partido de centro-direita - União Democrata-Cristã (CDU) de 2000 a 2018.
O mundo democrático aguarda esse resultado, sobretudo a União Europeia, pela importância na economia e na política global.
A campanha foi uma das mais acirradas no país, entre o candidato de Merkel, o conservador, Armin Laschet e o social democrata: Olaf Scholz. A candidata verde Annalena Baerbock (ecologista) alcançará provavelmente bom percentual de preferência.
Durante a campanha, a Alemanha deu o exemplo, mesmo sendo país líder da Europa, com excelentes níveis de vida, de priorizar a questão social.
Essa é a lição que o processo eleitoral alemão traz para o Brasil, basicamente em relação à possibilidade de surgimento de uma “terceira via” na disputa presidencial de 2022.
As propostas a serem debatidas em nosso país terão que preservar a preocupação com a estabilidade social, sem o que não haverá desenvolvimento estável.
O eleitorado alemão não se sensibilizou com os discursos ultraliberais de controle rígido das finanças, prejudicando a concessão do mínimo para a sobrevivência da população.
Até o conservador Armin Laschet mudou a sua linha e passou a falar em benefícios sociais, sem perder a preocupação com a estabilidade econômica.
Olaf Scholz, o social democrata favorito, usa a máxima: ” "Você não dá o que não tem”.
Após a pandemia, na condição de ministro das Finanças de Merkel, o candidato Scholz não hesitou em romper com a ortodoxia orçamentária, recomendada pelos manuais do FMI e conservadorismo financeiro.
Ele priorizou presença maior do governo entre aqueles atingidos pela catástrofe epidêmica.
Após uma década de acúmulo de excedentes, a Alemanha contraiu bilhões de euros em novas dívidas desde 2020, em detrimento de suas regras constitucionais rígidas, semelhantes ao teto de gastos do Brasil.
A regra do “teto” (freio à dívida), está inscrita na Constituição alemã, proíbe o governo federal de se endividar acima de 0,35% de seu Produto Interno Bruto (PIB).
Nas circunstâncias excepcionais da pandemia, porém, o governo solicitou permissão para ultrapassar esse limite.
Foi o que aconteceu, quando o país lançou um pacote de ajuda de 130 bilhões de euros (US$ 157 bilhões) para futuros investimentos e para impulsionar o consumo, quebrando a regra de freio à dívida após anos de rígida disciplina orçamentária.
"Tudo isto é caro, mas não fazer nada seria ainda mais caro", insistiu Scholz, contrário à redução do imposto sobre grandes fortunas prometida pelos conservadores e favorável ao aumento do salário mínimo, que chegou a 12 euros (80 reais) por hora.
Mais bolsas aos estudantes, ajudas para mães trabalhadoras e contra a pobreza infantil.
Essas medidas sociais implantadas em país desenvolvido, não podem ser rotuladas de populismo, como acontece no Brasil, diante de reivindicações semelhantes.
A Alemanha e o mundo livre mostram que o “mercado” é um ente abstrato, que não pode por si só regular as sociedades, atrelado ao princípio da oferta e da procura.
Se houver necessidade de sacrifícios coletivos, a regra será sempre distribuir com todos e não apenas “alguns”.
Para isso, muitos países estão adotando a “lei transitória”, que é aquela que vige num período e pode ser revogada depois, se não houver mais razão de existir.
A propósito do Brasil, não são promissoras a s relações futuras com a Alemanha.
Há um mês, Bolsonaro recebeu no Brasil a visita da deputada da AfD Beatrix von Storch, líder de movimento da ultradireita, com posições neonazistas, que gerou repercussões negativas.
O fato repercutiu pessimamente na Alemanha e o governo brasileiro arcou com desgaste, que poderia ter sido evitado.
Após as eleições de hoje, o mundo reverenciará a figura de Merkel, que deixa o poder.
Ela até tem o apelido de 'mãezinha da nação”, sendo respeitada pelo seu legado em todo o mundo.
Espera-se que o seu exemplo prospere nas democracias globais.