Notícias

Americanos desaprovam Trump; democratas chegam forte em 2020

Postado às 09h32 | 03 Nov 2020

João Paulo Jales dos Santos. Graduado em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

Sem ter a mesma rejeição de Hillary, Biden avançou em praticamente todos os grupos eleitorais 

Segundo o site U.S. Election Project, até às 16 horas desta segunda-feira, pouco mais de 96 milhões de americanos já votaram antecipadamente, isso equivale a cerca de 70,40% do total de votos depositados na presidencial de 2016. A estimativa do site Five Thirty Eight é que entre 140 e 160 milhões de americanos votem neste pleito.

Dos 96 milhões que já votaram, quase dois terços preferiram enviar seus votos por correio ou depositar suas cédulas nos locais de arrecadação de votos. O outro terço optou por votar pessoalmente, o que ocasionou enormes filas nos grandes centros urbanos de estados como Carolina do Norte, Flórida, Texas e Geórgia, alguns dos campos de batalha que apresentam uma acirrada disputa entre Biden e Trump. A votação por correio ou depósitos de cédulas em localidades oficiais é uma medida que era recorrente em alguns poucos estados, e que por excepcionalidade da pandemia foi modificada e ampliada nas dezenas de estados que não tinham esta tradição.

A campanha de Trump tende na noite desta terça-feira já decretar vitória. Trump tende a aparecer à frente de Biden em um punhado de estados que são considerados indecisos e até mesmo naqueles que estão com uma leve inclinação para Biden, como Nevada, Michigan, Wisconsin e Pensilvânia. Biden, possivelmente, atrás de Trump nos estados tidos como campo de batalha na noite da eleição tem uma razão de ser. Os votos enviados por correio, que as pesquisas indicam como esmagadoramente pró-democrata, em muitas seções eleitorais devem levar dias para serem contados. Os votos depositados pessoalmente antes do dia da eleição, apresentam uma maioria democrata, mas não tão robusta como deve ser a votação por correio.

O eleitorado trumpista, segundo indicam estimativas estatísticas, tende a representar entre 60 a 65% dos votos que serão dados nesta terça. E como estes votos serão contados bem mais rapidamente do que os votos por correio em dezenas de estados, Trump quer tirar proveito disso para declarar sua vitória muito antes do resultado final ser divulgado. Desse modo, age também para desacreditar a votação por correio, estratégia que a alta cúpula republicana vem adotando para tornar cética a votação postal, que as autoridades oficiais afirmam serem precisamente segura.

A elite democrata, depois das derrotas de Al Gore e Hillary Clinton, vai se manter firme e coesa e irá esperar o que muitos dentro do partido vêm dizendo há meses, “esperar até o último voto ser contado.” Se em 2000 os dems (democratas), não tiveram a agilidade estratégica de mobilizar sua base para fazer pressão na recontagem da Flórida, nesta eleição o roteiro será o antônimo da cartilha adotada por Al Gore e seus aliados. Os dems farão pressão e conclamarão seu eleitorado para ir às ruas contra uma provável tentativa de golpe ou não concessão de derrota por parte de Trump. E dessa vez os democratas tem um batalhão muito maior do que tinham em 2000 para botar nas principais avenidas dos grandes centros urbanos.

Neste 2020, o eleitorado metropolitano, que tem forte poder de influência na opinião pública e alta capacidade de mobilização, é muito mais democrata do era em 2000. A eleição será nesta terça, mas o resultado final em importantes seções eleitorais, por causa do enorme contingente de votação postal sem precedentes em outros pleitos, deve demorar até uma semana para ser oficializado em praças que podem decidir quem governará os EUA nos próximos 4 anos.

George W. Bush quando teve menos votos polares que Al Gore em 2000, conseguiu ampliar sua base eleitoral e saiu-se vitorioso na votação popular em 2004. Donald Trump, preferiu não seguir a mesma estratégia que seu colega de partido adotou há 16 anos. Tendo ficado a 2,10% atrás de Hillary na votação popular, número maior do que o enfrentado por Bush em 2000, 0,50%, Trump optou por não ampliar sua base eleitoral, é tanto que o perfil do seu eleitorado agora em 2020 é basicamente o mesmo que o elegeu em 2016. Além desse agravante, Trump só conseguiu chegar à presidência porque derrotou Hillary por menos de 1% nos 3 campos de batalha que decidiram em 2016, Wisconsin, Michigan e Pensilvânia.

Biden conseguiu fazer incursões com um eleitorado que foi caro à derrota de Hillary em 2016, os brancos sem diploma universitário, o grupo que em 2012 foi crucial para manter Obama mais 4 anos na presidência. Biden ampliou substancialmente a vantagem que Hillary teve frente à Trump com os brancos com diploma universitário, e tem tido nos subúrbios um desempenho melhor do que a democrata teve há 4 anos. Biden conseguiu trazer para níveis próximos de preferencia junto ao eleitorado branco, que estatisticamente representa mais de 70% dos que votam na eleição, a mesma simpatia que os brancos tiveram por Obama em 2012. O grande salto democrata neste pleito é recuperar apoio junto aos brancos.

Mesmo com um desempenho inferior a Hillary junto aos não-brancos, especialmente os latinos, o aumento de apoio entre os brancos, principalmente os com diploma universitário, fez com que Biden chegasse forte para vencer em estados que 4 anos atrás optaram por Tump.

Se na Câmara dos Deputados, de maioria democrata, a dúvida paira em quantos ganhos de cadeiras os dems terão, no Senado, a maioria republicana está em perigo. Os democratas conseguiram ampliar seu campo de batalha no Senado, recrutando candidatos bastante credíveis e com capacidade de arrecadação de fundos. Em estados fortemente republicano como Kansas, Carolina do Sul e Alaska, os democratas trouxeram dores de cabeça aos republicanos. Na Geórgia, onde os dois assentos do GOP (republicano) estão em jogo, os dems conseguiram na reta final de campanha fazer uma disputa onde 2 senadores republicanos saíssem de uma situação de leve vantagem, para uma indecisão.

Já no Texas, a candidatura democrata teve problemas demasiados, e mesmo apresentando certo crescimento na reta final, os republicanos ainda são favorecidos para manterem seu senador no 2º estado mais populoso. Em Montana, Iowa e Carolina do Norte, os senadores republicanos estão tecnicamente empatados com as candidaturas democratas. Já no Arizona, Colorado e Maine, onde os republicanos buscam reeleição, o cenário é pintado como pró-democrata.

Se no Michigan e em Minnesota o início de campanha causou certo susto aos senadores democratas que buscam reeleição, os dems chegam na reta final como favoritos para manterem seus assentos. A única exceção para os dems é no Alabama, um estado solidamente republicano, que elegeu um democrata numa eleição especial em 2017, mas que deve devolver ao GOP este assento. As corridas indecisas ou com uma leve vantagem para uma das partes, devem ser acompanhadas de perto, porque são elas que decidirão qual partido terá o controle do Senado a partir do próximo ano.

As tantas eleições estaduais para Câmaras, Senados, secretário de estado, procurador-geral, tesoureiro, Suprema Corte e tantos outros cargos, merecem serem acompanhadas porque são de suma importância. Foi a partir de 2010, quando os republicanos conquistaram vitórias para vários cargos naquele pleito, que a legenda conseguiu instaurar na maioria dos estados uma maioria conservadora que só foi interrompida ou diminuiu seu alcance na eleição de 2018.

A isso, soma-se que 2021 será o ano em que as Assembleias dos estados terão que fazer redistritamento naquelas localidades que irão perder ou ganhar assentos na Câmara Federal. O redistritamento é crucial para os democratas não ficarem quase uma década sem ter maioria na Câmara dos Deputados.

Em 2011, depois de ganharem as eleições legislativas de 2010, os republicanos, em uma dezena de estados, suprimiram assentos democratas, aumentado artificialmente a maioria que o GOP teve na Câmara dos Deputados até 2018, quando redesenharam uma alta quantidade de distritos país afora para favorecer candidaturas republicanas. O impeachment de Trump que os dems levaram adiante foi a prova que o partido decidiu sair da defensiva, postura que vinha adotando nos últimos anos, jogando com a mesma falta de temor que a direita há décadas adotou na vida política americana.

Donald Trump deixará como seu maior legado as 3 indicações que fez para a Suprema Corte. E a última indicação, onde uma conservadora, há pouquíssimos meses de Trump encerrar seu 1º mandato, o que não vinha sendo a tradição tomada pelos presidentes, assumiu o lugar de uma juíza liberal, foi a gota d’água para a esquerda.

Agora, os conservadores detêm 6 cadeiras na Suprema Corte, contra apenas 3 dos liberais. E essa maioria conservadora poder ser crucial para decidir prováveis ações referentes a eleição, já que os republicanos vêm sinalizando, custe o que custar, que para evitarem uma derrota de Trump, que vem sendo sinalizada há aproximadamente 2 meses, podem levar contestações jurídicas a mais alta corte.

A disputa no Arizona, mesmo que próxima, indica uma estável vantagem para Biden há alguns meses. No Texas, Trump viu a disputa estreitar nas últimas semanas, fazendo com que o respeitável site de análise política The Cook Political Report, classificasse o estado como indeciso.

Na Pensilvânia, Biden viu Trump se aproximar, mas o democrata ainda tem uma leve vantagem. Em Iowa, Trump geralmente continua liderando as pesquisas, mas Biden segue próximo, tornando a disputa aberta.

Na Flórida, Biden vem apresentando resultados estáveis, mas o histórico de corridas disputadas faz com que tanto dems quanto republicanos tenham o estado como indeciso. Na Geórgia, Ohio e Carolina do Norte, a disputa está ponto a ponto. E foco em Ohio, o estado é um excelente termômetro, nas últimas décadas quem venceu por lá, levou a presidência.

 Biden deverá vencer com uma vantagem relativamente razoável na votação popular. Mas a eleição americana é indireta, quem decide é o Colégio Eleitoral, que nos anos 2000 fez com que Bush e Trump chegassem à Casa Branca mesmo sendo menos votados que seus adversários democratas. O número de indecisos é baixo, quando se compara com 2016, onde a imensa maioria destes preferiu Trump a Hillary.

Se ainda não sabemos quem vencerá este pleito, o resultado silenciosamente já é conhecido há aproximadamente 2 meses, onde quem vencer nesta presidencial, já era estava silenciosamente eleito há 2 meses. Joseph R. Biden Jr. provavelmente comandará, com a companhia de Kamala Devi Harris, nos próximos 4 anos, o mais importante império do mundo capitalista.   

* Matéria de responsabilidade do autor do texto.

Deixe sua Opinião