Postado às 04h29 | 15 Jul 2020
Bruno Boghossian
Antes de provocar alvoroço na caserna, Gilmar Mendes já havia usado o termo "genocídio" três vezes para se referir ao desempenho do governo na crise do coronavírus. Em junho, depois que Jair Bolsonaro ordenou uma maquiagem nas estatísticas, o ministro disse que a manobra não eliminaria a responsabilidade do presidente pelo morticínio.
Naqueles episódios, não se ouviu ranger de dentes ou toque de corneta nos quartéis. Os militares só reagiram agora, quando Gilmar disse que o Exército estava associado ao desastre na saúde. A ideia era proteger as Forças Armadas das críticas, mas os comandantes acabaram passando um recibo definitivo sobre seus vínculos com o presidente.
A resposta dos militares e a decisão de acionar a Procuradoria-Geral da República contra o ministro do Supremo amarram ainda mais esse grupo aos resultados e fracassos do governo. Embora a saída do general que comanda o Ministério da Saúde tenha entrado em pauta, é tarde para dizer que os fardados não fazem parte dessa engrenagem.
Ao reforçar a integração entre os militares e o bolsonarismo, as críticas de Gilmar acabaram despertando a adormecida ala ideológica do governo. Abalado pelas investigações que cercam o Palácio do Planalto, o grupo que fornece ao presidente sua doutrina ultraconservadora voltou a se movimentar para recuperar influência no centro do poder.
Partiu de um dos formuladores desse núcleo, nesta terça (14), um diagnóstico sobre a sustentação do governo. Filipe Martins, assessor da Presidência, reconheceu nas redes o enfraquecimento dos olavistas, descreveu as críticas aos militares como um projeto do establishment político e afirmou ser necessário "resgatar e proteger" o núcleo ideológico.
Trata-se de um apelo para que Bolsonaro retome sua guerra institucional. É, ainda, uma reação aos generais que afiançaram uma aproximação com os demais Poderes e convenceram o presidente a camuflar seu radicalismo com um discurso aparentemente mais moderado.