Postado às 06h42 | 03 Abr 2020
Bernardo Mello Franco
É cada vez mais ingrata a situação de Luiz Henrique Mandetta no governo. Responsável pelo combate ao coronavírus, o ministro da Saúde já vinha sendo desautorizado pelo chefe. Ontem sua fritura alcançou um grau inédito, com direito a ameaça de demissão pelo rádio.
Em entrevista à Jovem Pan, Jair Bolsonaro voltou a atacar as medidas de isolamento defendidas pelo auxiliar. Ele disse ainda que o Ministério da Saúde teria sido tomado por um “clima de pânico” com a pandemia.
Questionado sobre o futuro do ministro, o presidente afirmou que não pretende demiti-lo “no meio da guerra”. Em seguida, ressaltou que “todo mundo pode ser demitido”. Mais Bolsonaro, impossível.
Foram três minutos de artilharia ininterrupta. “O Mandetta já sabe que a gente tá se bicando há muito tempo”, disse o capitão. “Ele é uma pessoa que em algum momento extrapolou”, prosseguiu. “Tá faltando um pouco mais de humildade para ele”, arrematou.
Foi o ataque mais explícito ao ministro, mas talvez não tenha sido o mais humilhante. Na quarta-feira, Bolsonaro montou uma armadilha para desmoralizar Mandetta diante da própria classe. Promoveu uma reunião de médicos no Planalto e não convidou o auxiliar.
O tema do encontro foi a hidroxicloroquina, que o presidente trata como panaceia contra um vírus que não tem vacina nem tratamento. O medicamento ainda está em fase de testes, sem eficácia comprovada. Além de desaconselhar seu uso sem prescrição, Mandetta já informou que ele provoca arritmia e pode causar parada cardíaca.
Em conversas reservadas, o ministro tem reclamado do clima de sabotagem. Um dirigente do DEM conta que ele está “louco para ir embora”, mas não quer pedir demissão. Prefere que o chefe assuma o desgaste de demiti-lo. “Virou um jogo de gato e rato”, resume o aliado.
À Jovem Pan, Bolsonaro disse que Mandetta precisa “ouvir um pouco mais o presidente”. Na prática, isso significaria trocar a ciência e a medicina por receitas que o capitão colhe na porta do Alvorada e em grupos de zap. Ao fim da entrevista de ontem, ele disse aos brasileiros que “papai do céu está conosco” e pediu um dia de jejum e orações “para a gente ficar livre desse mal”