Postado às 06h26 | 16 Jun 2019
Análise política, do que acontece em Brasília: o olho do furacão!
Artigo de Ney Lopes, publicado no DIÁRIO DO PODER, editado em Brasília, DF.
No atual momento de turbulência política que atinge o país, realça um fato altamente positivo: as instituições nacionais dão demonstração de estabilidade e os caminhos estão sendo abertos pela via democrática.
O fundamental é preservar a Democracia!
Sem essa preocupação, toda conquista será efêmera, instável, passageira e colocará o país na “contra mão” da história. Vejam-se os exemplos no mundo, daqueles países que optaram por regimes autoritários, à margem da lei. Não há um só caso, que confirme ter sido esse caminho o meio eficaz para superação das dificuldades econômicas, sociais e políticas.
Analisemos quatro situações de pré-crise atualmente nas manchetes da mídia e que estão sendo conduzidas com firmeza e convicção democrática.
Congresso
O debate em torno do relatório da reforma da Previdência anuncia realmente um “novo Brasil” que nasce, com o indispensável controle do Poder Legislativo exercido em relação ao Executivo.
A justificativa está na Constituição, ao consagrar os princípios da separação dos poderes e a concepção do regime representativo, que se caracteriza pelo exercício da dupla missão de legislar e fiscalizar.
Neste particular há que se destacar o papel relevante que vem sendo exercido pelo presidente da Câmara Rodrigo Maia, na valorização do poder legislativo. Tem agido com lucidez e firmeza, merecendo o respeito da Nação, até o momento.
Todavia, falta ainda muito a ser conquistado.
Por justiça deve ser citada a participação do presidente do Senado, senador Davi Alcolumbre, por ter anunciado recentemente a prioridade para o debate e votação da reforma política, como meta a ser alcançada em curto prazo.
Uma verdade é incontestável: sem mudanças eleitorais, políticas e partidárias, nenhuma outra reforma terá vida longa no Brasil.
Portanto, espera-se que a prioridade do senador Davi Alcolumbre seja realmente confirmada.
A reforma política será o alicerce de todas as outras reformas.
Previdência
Inusitada, descabida e imprópria a reação do ministro Paulo Guedes, ao detratar o papel dos congressistas, em razão de mudanças feitas em sua proposta original de reforma previdenciária.
Afinal, o ministro não pode considerar-se acima do bem e do mal e “dono da verdade”, por mais preparo técnico e boas intenções que tenha.
Vivemos numa democracia e a gestão pública não é idêntica à gestão privada.
Há que existir a visão social, pois ao Estado cabe prover e assistir quem tenha vocação para ganhar dinheiro e assim possa decidir ir residir no exterior, daquelas pessoas que nasceram sem a vocação para o lucro e optaram, por exemplo, pelo serviço público.
A reforma da previdência é absolutamente necessária. Tenho repetido isso à exaustão. Mas, não pode ser feita a “ferro e a fogo”.
Se tiver de ser realizada em etapas, que assim seja. Portugal, Grécia, França, Itália e outros países mudaram as suas previdências sem “traumas”, “choques sociais” e por etapas. Em alguns desses países ainda hoje se implantam regras de transição a médio e longo prazo.
Um ponto é essencial no debate: os “sacrifícios” têm que ser divididos, para as mudanças serem justas.
O que foi proposto não divide “sacrifícios” e concentra todo ônus nas costas dos trabalhadores, servidores e beneficiários da previdência. Esses seriam os “vilões” e únicos responsáveis pelo déficit previdenciário.
Não é justo esse entendimento, daí porque o Congresso faz algumas alterações, que ainda necessitam serem complementadas com a inserção de outras “fontes fiscais” para suprir o “déficit”, totalmente preservadas e protegidas, até agora, pelo “indignado” ministro Paulo Guedes.
Dito “indignado” pelo registro da mídia às suas reações, após o debate do Parecer da reforma.
Por que acusar o serviço público em geral de nocivo corporativismo, negando o valor de quem exerce suas funções com senso de responsabilidade, nivelando-os aos excessos de mordomias e super salários, que devem ser eliminados.
Se for para condenar corporativismo, o editorial recente do insuspeito jornal conservador Estado de São Paulo deveria ser lembrado.
O texto faz menção ao Boletim Mensal sobre os Subsídios da União da Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria (Secap) do Ministério da Economia.
Demostra a ineficácia dos benefícios fiscais concedidos no Brasil para o estímulo à produção, empregos e, consequentemente, aumento da receita (2003/2015).
No Brasil, os incentivos subiram constantemente entre 2003 e 2017 (passaram de cerca de 2% para 4,5% do PIB). No período, a receita fiscal e oferta empregos em nada contribuíram para o aumento da atividade econômica.
Diz o editorial, que em seminário virtual realizado em Brasília pelo Banco Mundial foi constatado que na Austrália houve aumento de arrecadação e de emprego. As renúncias tributárias aumentaram entre 2011 e 2019, passando de 8% para 10% do PIB. Nesse período, a arrecadação passou de 32% para 36% do PIB. Os incentivos evoluíram de 6% para 7% do PIB e a receita, de 38% para 40%.
No Canadá, os incentivos evoluíram de 6% para 7% do PIB e a receita, de 38% para 40%.
Por que no Brasil não se faz um levantamento criterioso do “vazamento de dinheiro público” ocorrido nas concessões dadivosas de incentivos e isenções para, igualmente ao que aconteceu na Lava Jato, ser obtida a devolução desse dinheiro desviado criminosamente.
Se o fato tivesse ocorrido nos Estados Unidos, a “pátria do capitalismo” as medidas teriam sido severas.
Diante de fatos concretos, como os relatados pelo Estado de São Paulo, não procede a “indignação” do Sr. Guedes com os deputados, por não aprovarem tudo que ele queria.
Ao contrário, os plenários da Câmara e do Senado devem avançar em mais alterações, dividir “sacrifícios” e assim alcançar até mais de 1 trilhão de reais de economia para estabilizar a nossa economia.
A meta financeira deveria ser mantida. Mudanças, apenas nas formas de obtê-la.
Moro
Antes de interpretar, com sensacionalismo inconsequente, os diálogos divulgados em “escuta ilegal” que envolvem o ministro Sérgio Moro, é necessário refletir como está definido em lei o nosso processo penal e como deve agir o juiz.
O artigo 399 § 2° do Código de Processo Penal estabelece o princípio da “identidade física” do Juiz, ou seja, quem presidiu a instrução deverá prolatar a sentença.
Em outros países não é assim. Na Alemanha, Chile, Portugal e outros existe o “juiz de garantias”, que tem a competência para o julgamento da causa, restringindo-se sua atuação à fase de investigação criminal. Ele zela pela legalidade da investigação, além de tutelar de maneira plena a observância dos direitos e garantias fundamentais, sendo-lhe vetada qualquer iniciativa investigatória.
No procedimento penal brasileiro prevalece a regra do artigo 156, do Código de Processo Penal, a seguir transcrita:
“A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante”.
Observem-se outros dispositivos legais pertinentes a presente análise:
CPP
Art. 40. Quando, em autos ou papéis de que conhecerem, os juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.
LEI DE AÇÃO PÚBLICA
Art. 7º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis.
A dedução clara é que o Juiz brasileiro tem competência no processo inquisitório para ordenar, antes de iniciada a ação penal e antes de proferir sentença, a realização de diligências e colheita de provas que considere urgentes e relevantes.
Ele faz isso de que maneira?
Claro que em harmonia com a polícia e o Ministério Público.
Cabe ressaltar, por absolutamente necessário, que nessa relação entre Juiz, MP e polícia, os “excessos” serão severamente punidos, tais como, dirigir provas para condenar, “armar” flagrante preparado, aconselhar diretamente quem faça a investigação, visando prejudicar o réu e outros procedimentos semelhantes.
Todavia, os fatos que possam determinar “suspeição” devem ser objetivos, concretos, de forma a não deixar duvidas.
Não cabem meras suposições.
Sem “meias palavras”: os diálogos até agora divulgados (não se sabe o que será divulgado amanhã) em nada incriminam o Ministro Moro.
Acusam relacionamento em busca da verdade nos autos, sem indício do propósito de condenação prévia. Tanto é verdadeiro, que alguns acusados foram absolvidos na operação Lava Jato.
As regras do processo penal brasileiro asseguram esse comportamento, repita-se, desde que não se comprovem “excessos”.
Bolsonaro
Uma palavra final: o presidente Bolsonaro tem dado demonstração de respeito às “regras do jogo democrático”, que deve ser registrada.
O chefe da nação repete que acatará a decisão do Congresso, no caso específico da reforma previdenciária, não sendo infelizmente seguido pelo seu “poderoso” ministro da Economia.
Assim é que deve ser um governante, que recebeu do povo brasileiro a missão de aperfeiçoar a nossa democracia e não de colocá-la em risco.